* Por Flávio Gomes
Pedro de la Rosa foi anunciado hoje como “desenvolvedor” da Ferrari. Não sei direito o que é um “desenvolvedor”. Pilotar, De la Rosa não vai. Se chegar a guiar algum carro vermelho, será em exibições ou, em caso extremo, nos testes de inverno na Espanha. Caso extremo porque com tão pouco tempo para testar, é insanidade um titular perder meia hora de treino com um carro novo.
Aos 41 anos (faz 42 em fevereiro), o espanhol se junta, entre outros, ao conterrâneo Marc Gené no time de pilotos contratados da Ferrari para fazer sabe-se lá o quê. Gené é outro caso de estudo nesta cada vez mais esquisita F-1, que está cheia de pilotos que não pilotam. Ele recebe salários da Ferrari desde 2005. Entra no nono ano com carteira assinada em Maranello sem nunca ter largado em um GP sequer pelo time italiano.
Gené, 38 anos, tem no currículo 36 corridas disputadas na F-1, 33 delas pela Minardi em 1999 e 2000. Em 2001, foi contratado como piloto de testes da Williams, onde ficou quatro anos. Correu três vezes pela equipe de Grove, uma em 2003 e duas em 2004 — sua última aparição num grid. Desde 2007, divide o trabalho de barnabé na Ferrari com o de piloto de verdade em uma categoria bem diferente, a dos protótipos. Foi um dos nomes importantes da Peugeot de 2007 a 2011, até ser chamado pela Audi no ano passado para o Mundial de Endurance. Assim, pelo menos corre, se mantém em atividade, sabe o que é disputar freadas e fazer ultrapassagens. Com carros, insisto, muito diferentes dos de F-1. O bico na Ferrari, bem remunerado, é um emprego e tanto.
De la Rosa vai trabalhar basicamente em simulador. Putz. Pode haver algo mais triste para um piloto do que cumprir carga horária num Playstation metido a besta? Ah, é importante, dirá alguém. Importante porque na F-1 não pode mais fazer treino privado, tem de usar todos os recursos à mão. Certo. OK. Mas sem dirigir, sem ter de colocar o cinto, sem ouvir o barulho do carro, sem sentir o calor dentro do capacete ou a chuva molhando o macacão? Sem ter uma grid girl segurando a placa para dar uma piscadinha? Sem participar do briefing dos pilotos, sem poder tirar onda com o colega de outra equipe, sem falar com os mecânicos, sem almoçar no motorhome no meio da muvuca? Que diabo de trabalho é esse?
É o trabalho de “desenvolvedor”. Num laboratório cheio de computadores, chips, mouses e telas enormes de LCD. Que puta saco, deve ser isso. Mas considerando que a Europa está em crise, a Espanha particularmente, melhor ter um emprego assim do que ficar na fila da sopa. E para De la Rosa, não correr não deve ser nenhum drama. Afinal, durante sete anos, de 2003 a 2009, foi piloto de testes da McLaren. Verdade que naqueles tempos o piloto de testes testava, era permitido. Não ficava no videogame. Ia para a pista e queimava borracha.
O amigo de Alonso (tem o dedo de Fernandinho nessa contratação, claro), ao menos, correu bem mais que Gené na F-1. Foram 104 GPs em sete temporadas como titular (ou quase isso; em 2001, assumiu o carro da Jaguar no meio da temporada). Correu na Arrows em 1999 e 2000, na Jaguar em 2001 e 2002, fez algumas provas pela McLaren em 2006, quando Montoya desertou, na Sauber em 2010 e 2011 e na HRT no ano passado. Talvez tenha se dado conta, ao ver Schumacher quarentão saindo de cena, que era hora, igualmente, de evitar emoções muito fortes.
Será útil à Ferrari? Suponho que sim, afinal a Ferrari é uma equipe grande, sabedora de suas necessidades e urgências. Mas, cá entre nós, acho um exagero tão grande ter um piloto profissional de F-1 recebendo salário para guiar em simuladores… Os titulares não podem fazer isso também? Cobram hora extra?
Piloto que não pilota. Esse é o cargo de De la Rosa. Belo enganador, isso sim!
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