segunda-feira, 4 de junho de 2012

Dos tempos da quebradeira*

* Por Luis Fernando Ramos



Temos motivos de sobra para acreditar que o Mundial de 2012 terá pelo menos um sétimo vencedor. Em alguma etapa, Lewis Hamilton e a equipe McLaren encaixarão um final de semana sem erros e sairão vitoriosos. O fato de ter somado três pódios e somado pontos em todas as corridas até agora sustentam isso. Meu palpite (e puro palpite) é de que esse final de semana vai chegar justamente no Canadá, lugar onde ele venceu pela primeira vez na Fórmula 1.

Fazendo um levantamento das temporadas em que tivemos sete ou mais vencedores, chegamos a um retrato claríssimo de uma época. A primeira vez que isso aconteceu foi em 1968, um campeonato até dominado com certa clareza por Graham Hill, mas que trouxe uma variedade interessante com a McLaren e a Matra fazendo frente a Lotus em algumas ocasiões - e com dois vencedores menos normais, o que acontecia muito na época.

Em 1970, também em um Mundial dominado pela Lotus, o sétimo vencedor aconteceu justamente com o triunfo de Emerson Fittipaldi com o Lotus 72 em Watkins Glen, quando assumiu o posto de número um da equipe deixado pela morte de Jochen Rindt em Monza.

O mais impressionante vem depois. Entre 1974 e 1983, apenas o Mundial de 1978 não teve pelo menos sete vencedores - foi também um ano com domínio absoluto do modelo Lotus 79 (o precursor dos carros-asa) e que, ainda assim, teve seis vencedores. De resto, em nove entre dez temporadas, a distribuição de vitórias foi extremamente generosa. Chegando a extremos como o ano de 1982 com onze vencedores distintos. 1975 trouxe nove pilotos diferentes no topo do pódio e as temporadas de 1977 e 1983 tiveram oito ganhadores.

Estamos falando aqui de um período em que havia diversos experimentos nos carros e no qual, acima de tudo, eles quebravam muito. Corridas com apenas seis, sete ou oito pilotos chegando ao final em um grid de 26 aconteciam aos montes. Num índice de confiabilidade tão baixo como esse, é natural que a vitória acabe caindo no colo de nomes cujo carro jamais poderia ganhar uma prova se apenas a performance fosse levada em conta.

O que mudou a partir de 1984, para que esse quadro mudasse? Uma série de coisas, na verdade. A McLaren sob o comando de Ron Dennis trouxe o monocoque em fibra de carbono e uma nova realidade em termos de organização de uma equipe. O desenvolvimento da eletrônica nos carros e a revolução tecnológica tornou muito mais fácil e eficiente monitorar todos os elementos de um carro para evitar uma quebra. E o volume de patrocínio (e de dinheiro de forma geral) multiplicou-se de tal forma que pode se gastar mundos e fundos para que os carros terminem corridas, somem pontos e, com isso, garantam às equipes a maior parcela possível do prêmio em dinheiro que é distribuído no final do ano. Terminar é preciso, ser inventivo apenas pela curiosidade de engenheiro deixou de ser uma opção, como foi nos anos 70.

Quando fui à Brackley visitar a fábrica da então BAR-Honda em julho de 2004, o setor que mais me impressionou era o que trabalhava justamente na questão de confiabilidade. Numa sala escura, iluminada apenas por uma luz negra, cada componente do carro que seria utilizado na prova seguinte era borrifado com um spray fosforescente. Isso permitia perceber qualquer microfissura na fibra de carbono ou no metal. Se fosse o caso, a peça era jogada fora e substituída. Dá para imaginar o custo de tudo isso? O das peças, o dos funcionários, o dos materiais usados nesse controle, tudo para encontrar eventualmente uma fissura de milímetros num componente do carro?

Assim podemos ter ideia da anomalia que é termos seis - e potencialmente sete - vencedores nesta temporada de 2012. Mas não é uma anomalia ruim, muito pelo contrário. Muito se falou do papel dos pneus nesse quadro, mas não vamos nos esquecer da importância do fim do difusor soprado nessa equação. A solução funcionava perfeitamente no carro da Red Bull do ano passado e apenas a McLaren - e apenas no final do ano - conseguiu equilibrar um pouco isso.

Sem isso nos carros, houve uma aproximação enorme no desempenho das equipes. Soma-se isto com a estreita janela de funcionamento dos pneus Pirelli e a dificuldade dos engenheiros de compreender o funcionamento de seus carros em relação à ela para chegarmos ao quadro atual. Numa época onde a telemetria e o trabalho nas fábricas cuidam para que os carros sejam praticamente inquebráveis, a Fórmula 1 volta a um equilíbrio do tempo da quebradeira.

E quem aí não adorava a multiplicidade de vencedores que havia naquela época?

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