quarta-feira, 30 de maio de 2012
Muitas surpresas e nenhuma certeza*
* Por Lito Cavalcanti
Admito que está difícil. Por mais que esprema a cabeça, não consigo chegar a uma conclusão do que pode ter significado o Grande Prêmio de Mônaco. Só sei que o fato da Red Bull ter se tornado a primeira equipe a vencer duas corridas me trouxe um certo temor. Preocupa-me a possibilidade de uma eventual repetição de um passado recente. Não cheguei a nenhuma conclusão, não sei o que pensar. Será que tudo que ficou da tão aguardada, badalada, sofisticada e glamorosa corrida do último domingo é uma ameaça de volta aos dois últimos anos?
Pode ser sim, e se for, nada mais normal. Não seria incomum, não foi a primeira vez. Pelo contrário, foi o terceiro ano seguido que um carro gerado pela criatividade de Adrian Newey dominou gregos e troianos nas ruas do principado. Ter sido Mark Webber e não Sebastian Vettel o vencedor não serve de alento. Se Vettel dominou no ano passado, Webber já havia vencido lá há dois anos. O temor que este resultado gerou é ver, a partir de Mônaco, o domínio dos Touros Vermelhos de 2010 e 2011, os anos em que Newey infringiu à Fórmula 1 uma previsibilidade que parecia definitivamente extinta. O último ano foi ainda pior: corrida após corrida era Vettel na pole position, Vettel no degrau mais alto do pódio, Vettel campeão. Ou melhor, bicampeão.
A ameaça pareceu ressurgir neste fim de semana. Primeiro, pelo domínio absoluto de Webber, que conseguiu até fazer uma raríssima largada perfeita; segundo, pela corrida perfeita de Vettel. Ele terminou em quarto, mas poderia ter sido bem melhor se não fosse por Kimi Raikkonen ter atrasado muito quem o seguia na fase inicial, abrindo um vazio enorme entre o pessoal da frente e o resto do pelotão. Assim, quando os pilotos que vinham à frente de Vettel voltaram da troca de pneus, encontraram pista limpa no lugar do trânsito com que o alemãozinho contava para ter uma chance, por menor que fosse, de chegar até mesmo à liderança.
Mas, nestas circunstâncias, por mais que voasse na pista durante as 15 voltas em que ocupou o primeiro lugar, Vettel tinha em seu encalço um Webber com pneus mais novos. Por isso, nunca chegou a abrir os 21 segundos de vantagem que lhe permitiriam trocar pneus e ainda voltar em primeiro. Mas até aí nada, era Red Bull contra Red Bull. E mesmo assim, o alemãozinho, que largou em nono, não chegou ao pódio por um triz. Mas seu quarto lugar nestas circunstâncias, é ou não é uma ameaça?
A esperança que resta é Mônaco ser uma pista inteiramente diferente das outras. A inexistência de trechos velozes faz com que o aspecto mais importante de um carro de competições moderno, a aerodinâmica, perca importância. Com curvas que mal passam de 100 quilômetros por hora, o que faz diferença é a tração – que lá só se consegue mecanicamente. Ou seja, é só do acerto das suspensões que depende a capacidade dos pneus traseiros de não girarem em falso quando os pilotos tentam transferir para o solo a enorme potência de que estes carros dispõem.
Com velocidades tão baixas, a pressão que o ar gera sobre as asas e sob o assoalho não é suficiente para pregar o carro no chão, como ocorre, por exemplo, na longa curva da entrada da reta de Barcelona. Lá, por sinal, se evidenciou há algumas semanas uma das deficiências da Ferrari. Para alguns carros, como o Williams vencedor de Pastor Maldonado, bastava apertar o acelerador até o fundo e virar o volante. Para os carros de Maranello, isso era impossível. Os pneus traseiros patinavam, perdiam aderência e derivavam lateralmente para fora da curva. Nada a fazer além de se conformar com a perda de velocidade. Insistir só resultaria em derrapagens e no indesejável aquecimento dos pneus traseiros.
Em Mônaco, porém, o que se viu foram os carros de Fernando Alonso e de Felipe Massa (sim, aquele mesmo Felipe Massa que, até o último fim de semana, era humilhado e maltratado por sua equipe e por seu país) acelerando forte na saída das curvas, sem mostrar o menor sintoma de deficiência de tração. Sim, os dois carros tinham algumas inovações, mas nada que explicasse esse novo comportamento. Asas portentosas para ganhar um pouco mais de pressão aerodinâmica todo mundo tinha. Mesmo assim os carros vermelhos estavam tracionando bem. Na linha de chegada, situada na reta dos boxes, o mais rápido era o Williams de Bruno Senna, que passava a 269,3 km/hora; Alonso era o quarto, a 268,1. Bom, não? Sim, claro. Evolução? Bem, difícil dizer.
Permanece a dúvida: será que esse melhor comportamento vai se repetir no GP do Canadá? Um ponto a favor: lá serão usados os mesmos pneus supermacios e macios que a Pirelli selecionou para Mônaco. As curvas também são lentas e as suspensões também têm de trabalhar com maciez suficiente para que os pilotos atropelem as zebras sem demolir os carros. Mas as velocidades na Île de Notre Dame, infinitamente mais altas, geram pressão aerodinâmica muito maior. Isso pode mudar muita coisa, para um lado ou para o outro.
Daí resta uma dúvida que só será respondida com o início dos treinos. Se os carros de Maranello se mostraram bastante eficientes em termos mecânicos, não deram o menor indício de evolução aerodinâmica. Ainda bem que há tempo para melhorar. No Canadá e na corrida seguinte, nas ruas do porto de Valência, o equilíbrio aerodinâmico não é tão importante – mas a partir daí ou os carros convivem bem com o ar que os cerca ou é melhor transferir todos esforços para o projeto do próximo ano.
No Canadá, a velocidade máxima conta muito. E este não é um quesito em que a Casa de Maranello pode se dizer tranquila. Muito pelo contrário: suas velocidades mais altas em Monte Carlo ficaram a dever de cinco a seis quilômetros por hora aos mais velozes. Nico Rosberg foi quem chegou mais rápido ao trecho mais veloz, a freada após o túnel: 285,1 km/hora; Alonso foi o quinto, 284,2, e Massa o sétimo, 283,8. A diferença é, de fato, pequena, mas tende a crescer exponencialmente à medida em que as velocidades aumentam. Em Barcelona, Romain Grosjean, o mais veloz, chegou a 323,8; Massa, o melhor da Ferrari, foi o 12º, com 316,6; Alonso, o 16º, 315,7. É um déficit além do razoável.
Sim, espera-se um ganho, mas ele nunca permitirá aos Ferrari se equipararem aos Lotus, que foram concebidos com a preocupação de opor resistência mínima à fluidez do ar que atravessa as laterais onde se alojam os radiadores. Isso só é possível por causa da maior capacidade dos motores Renault de conviver com temperaturas altas. Isso permite que os radiadores sejam menos expostos ao fluxo de ar que os da Ferrari, que para garantir as melhores temperaturas de funcionamento do motor dificultam a passagem e o escoamento do ar.
Outro ponto que explica a diferença de velocidade entre as duas marcas é o aerofólio traseiro. O da Renault é concebido para dar maior eficiência ao DRS, sigla que significa sistema de diminuição de resistência aerodinâmica, também chamada de asa móvel. Logo que ela se abre, a resistência do ar ao deslocamento do carro cai significativamente; o preço disso é menor eficiência do aerofólio quando o DRS não é acionado. Na Ferrari, ocorre justamente o oposto: com o DRS acionado, a asa é menos eficiente do que a da Renault; com ele fechado, ela gera mais pressão. Só que a asa é apenas um dos muitos apêndices que formam o conjunto aerodinâmico de um carro, onde a Ferrari continua deficiente...
Por essas e outras, não dá para se ter certeza de que a Ferrari será tão eficiente no Canadá quanto foi em Mônaco. Onde Felipe Massa, mesmo levando um pouco de azar com o trânsito e cometendo um pequeno erro no Q3, foi pouquíssimo mais lento que Alonso. Foi dele, aliás, o melhor tempo da Ferrari, aquele que lhe deu o primeiro lugar na segunda parte do qualify, o Q2. No Q3, onde Massa chegou pela primeira vez neste ano, Alonso foi o sexto e Massa o sétimo.
Há quanto tempo isso não acontecia? Sétimo no grid, o brasileiro voltou a largar bem e chegou à primeira curva lado a lado com Alonso, que havia ganho uma posição no grid graças à punição que deslocou Michael Schumacher da pole position para o sexto lugar. Na corrida, Massa foi perfeito. Pena que aqueles que o precederam também foram. Mesmo assim, se tivesse sido chamado para trocar os pneus duas voltas mais cedo, poderia ter superado Lewis Hamilton. Esta é a da própria Ferrari, que mudou de humores e teceu elogios rasgados ao brasileiro.
Merecidíssimos, aliás, mas não tranquilizadores. Felipe mesmo admitiu, após a bandeirada, que mesmo sem permitir ultrapassagens, Mônaco não permite projeções para o resto do campeonato. E o passado recente mostra que é ele o bode expiatório quando as coisas não andam bem. Principalmente diante do desempenho mais do que perfeito de seu companheiro. Por incrível que possa parecer, considerando o carro de que dispõe, o espanhol lidera sozinho o Mundial, três pontos à frente de, adivinha quem...É isso mesmo, Vettel e Webber, os pilotos de Adrian Newey.
Já lá se foram seis corridas, seis pilotos diferentes ocuparam o degrau mais alto do pódio. Mas aos poucos começa se delinear uma tendência, começam a se definir os candidatos mais fortes na ainda indefinida luta pelo título. São Alonso, o mais eficiente, e Vettel e Webber, os mais bem equipados. Jenson Button e Lewis Hamilton aos poucos perdem a força inicial à medida que se sucedem os erros da McLaren – a equipe inglesa ainda tem o mais alto padrão de engenharia, mas deixa a desejar nos treinos e corridas. A Lotus tem um dos melhores carros, mas tem também as piores escolhas estratégicas – para piorar, perde muito desempenho com as nada raras quedas de temperatura. Williams, Sauber e Force India melhoraram, mas não chegam a ameaçar o quarteto dominante.
Quarteto? Sim, não dá para descartar a Mercedes. Principalmente depois das muitas modificações que exibiram em Mônaco. Laterais mais afiladas, câmbio de fibra de carbono (bem mais leves) nos dois carros, novas suspensões traseiras e pinças de freios recolocadas na parte inferior dos discos, rebaixando o centro de gravidade e propiciando melhor fluxo de ar para o difusor. A inovação aerodinâmica teve pouca utilidade em Mônaco, mas o câmbio permitiu a adoção das novas suspensões traseiras e, também, o reposicionamento das pinças de freios. Tudo isso foi coroado com a pole position inesperada e aplaudidíssima de Schumacher e também com o terceiro tempo de Rosberg. Até o último fim de semana, não havia sido comum os Mercedes largarem tão perto nem tão bem posicionados – e ninguém apostaria um tostão furado na pole do alemão.
Pena que sua corrida foi prejudicada pelo encontrão com o promissor e atabalhoado Grosjean. Não cabe ao jovem franco-suíço nenhuma responsabilidade no ocorrido. Pressionado por um movimento extremamente agressivo por parte de Alonso, que chegou a bater rodas com a Lotus negra e dourada na disputa por uma posição que ganharia ali ou nunca mais. A Grosjean só restou tirar o pé, do que ele nunca cogitou, ou espremer Schumacher. Os dois carros se tocaram e a pior parte ficou para o novato. E também para Kamui Kobayashi, que teve seu Sauber irreparavelmente danificado exatamente na corrida em que largava em uma de suas melhores posições de largada do ano.
Por isso, não foi possível ver até onde poderia ir o inesperado ressurgimento do heptacampeão mundial. Ancorado atrás de Raikkonen, não pôde fazer nada além de seguir o finlandês até problemas de alimentação darem fim à sua corrida. Mais uma dúvida a ser dirimida nas próximas corridas: Schumacher está de volta a seus melhores dias? Sim ou não? Até que ponto? É só na classificação ou pode sustentar a surpresa volta após volta? A Mercedes resolveu, ou ao menos amenizou, o consumo exagerado dos pneus traseiros que mostrou nas etapas anteriores? Só vamos saber disso tudo no Canadá.
Lá também Bruno Senna será examinado de perto. Ele travou conhecimento com o circuito em 2010, nos tempos amargos da equipe Hispania. Sim, o carro era limitadíssimo, não permitia muito mais do que a luta entre seus dois pilotos. Mesmo assim, os dois dias de treinos e as 13 voltas de corrida, foram suficientes para Bruno ter claro em sua mente quais são as exigências da pista de um parque que só é usada uma ou duas vezes por ano. Melhor assim. Afinal, espera-se que desta vez ele venha a fazer o que não tem feito nas duas últimas corridas: dosar melhor a agressividade que o tem levado a desperdiçar no qualify o potencial de um carro que já venceu neste ano.
OK, nem sempre vai-se ver um Williams largando na primeira fila, pode ser até que isso nem se repita neste ano. Mas o desempenho de Pastor Maldonado tem deixado o brasileiro em situação vexatória. O 15º lugar do brasileiro no grid de Mônaco se compara negativamente com o nono tempo do venezuelano – ele depois caiu para os cafundós do grid, mas foi por punições que nada têm a ver a velocidade do carro ou do piloto. Está na hora de Bruno voltar a mostrar serviço. O 10º lugar na corrida monegasca foi um recomeço. Não foi nada brilhante, mas ruim também não chegou a ser. O problema maior é no qualify, é nessa hora que ele precisa mostrar bem mais do que fez até agora. Uma boa oportunidade para isso vai ser daqui a alguns dias, na Île de Notre Dame.
Por tudo isso, e por suas características, o GP do Canadá pode mostrar o que Mônaco não mostrou. Para o bem e para o mal.
Admito que está difícil. Por mais que esprema a cabeça, não consigo chegar a uma conclusão do que pode ter significado o Grande Prêmio de Mônaco. Só sei que o fato da Red Bull ter se tornado a primeira equipe a vencer duas corridas me trouxe um certo temor. Preocupa-me a possibilidade de uma eventual repetição de um passado recente. Não cheguei a nenhuma conclusão, não sei o que pensar. Será que tudo que ficou da tão aguardada, badalada, sofisticada e glamorosa corrida do último domingo é uma ameaça de volta aos dois últimos anos?
Pode ser sim, e se for, nada mais normal. Não seria incomum, não foi a primeira vez. Pelo contrário, foi o terceiro ano seguido que um carro gerado pela criatividade de Adrian Newey dominou gregos e troianos nas ruas do principado. Ter sido Mark Webber e não Sebastian Vettel o vencedor não serve de alento. Se Vettel dominou no ano passado, Webber já havia vencido lá há dois anos. O temor que este resultado gerou é ver, a partir de Mônaco, o domínio dos Touros Vermelhos de 2010 e 2011, os anos em que Newey infringiu à Fórmula 1 uma previsibilidade que parecia definitivamente extinta. O último ano foi ainda pior: corrida após corrida era Vettel na pole position, Vettel no degrau mais alto do pódio, Vettel campeão. Ou melhor, bicampeão.
A ameaça pareceu ressurgir neste fim de semana. Primeiro, pelo domínio absoluto de Webber, que conseguiu até fazer uma raríssima largada perfeita; segundo, pela corrida perfeita de Vettel. Ele terminou em quarto, mas poderia ter sido bem melhor se não fosse por Kimi Raikkonen ter atrasado muito quem o seguia na fase inicial, abrindo um vazio enorme entre o pessoal da frente e o resto do pelotão. Assim, quando os pilotos que vinham à frente de Vettel voltaram da troca de pneus, encontraram pista limpa no lugar do trânsito com que o alemãozinho contava para ter uma chance, por menor que fosse, de chegar até mesmo à liderança.
Mas, nestas circunstâncias, por mais que voasse na pista durante as 15 voltas em que ocupou o primeiro lugar, Vettel tinha em seu encalço um Webber com pneus mais novos. Por isso, nunca chegou a abrir os 21 segundos de vantagem que lhe permitiriam trocar pneus e ainda voltar em primeiro. Mas até aí nada, era Red Bull contra Red Bull. E mesmo assim, o alemãozinho, que largou em nono, não chegou ao pódio por um triz. Mas seu quarto lugar nestas circunstâncias, é ou não é uma ameaça?
A esperança que resta é Mônaco ser uma pista inteiramente diferente das outras. A inexistência de trechos velozes faz com que o aspecto mais importante de um carro de competições moderno, a aerodinâmica, perca importância. Com curvas que mal passam de 100 quilômetros por hora, o que faz diferença é a tração – que lá só se consegue mecanicamente. Ou seja, é só do acerto das suspensões que depende a capacidade dos pneus traseiros de não girarem em falso quando os pilotos tentam transferir para o solo a enorme potência de que estes carros dispõem.
Com velocidades tão baixas, a pressão que o ar gera sobre as asas e sob o assoalho não é suficiente para pregar o carro no chão, como ocorre, por exemplo, na longa curva da entrada da reta de Barcelona. Lá, por sinal, se evidenciou há algumas semanas uma das deficiências da Ferrari. Para alguns carros, como o Williams vencedor de Pastor Maldonado, bastava apertar o acelerador até o fundo e virar o volante. Para os carros de Maranello, isso era impossível. Os pneus traseiros patinavam, perdiam aderência e derivavam lateralmente para fora da curva. Nada a fazer além de se conformar com a perda de velocidade. Insistir só resultaria em derrapagens e no indesejável aquecimento dos pneus traseiros.
Em Mônaco, porém, o que se viu foram os carros de Fernando Alonso e de Felipe Massa (sim, aquele mesmo Felipe Massa que, até o último fim de semana, era humilhado e maltratado por sua equipe e por seu país) acelerando forte na saída das curvas, sem mostrar o menor sintoma de deficiência de tração. Sim, os dois carros tinham algumas inovações, mas nada que explicasse esse novo comportamento. Asas portentosas para ganhar um pouco mais de pressão aerodinâmica todo mundo tinha. Mesmo assim os carros vermelhos estavam tracionando bem. Na linha de chegada, situada na reta dos boxes, o mais rápido era o Williams de Bruno Senna, que passava a 269,3 km/hora; Alonso era o quarto, a 268,1. Bom, não? Sim, claro. Evolução? Bem, difícil dizer.
Permanece a dúvida: será que esse melhor comportamento vai se repetir no GP do Canadá? Um ponto a favor: lá serão usados os mesmos pneus supermacios e macios que a Pirelli selecionou para Mônaco. As curvas também são lentas e as suspensões também têm de trabalhar com maciez suficiente para que os pilotos atropelem as zebras sem demolir os carros. Mas as velocidades na Île de Notre Dame, infinitamente mais altas, geram pressão aerodinâmica muito maior. Isso pode mudar muita coisa, para um lado ou para o outro.
Daí resta uma dúvida que só será respondida com o início dos treinos. Se os carros de Maranello se mostraram bastante eficientes em termos mecânicos, não deram o menor indício de evolução aerodinâmica. Ainda bem que há tempo para melhorar. No Canadá e na corrida seguinte, nas ruas do porto de Valência, o equilíbrio aerodinâmico não é tão importante – mas a partir daí ou os carros convivem bem com o ar que os cerca ou é melhor transferir todos esforços para o projeto do próximo ano.
No Canadá, a velocidade máxima conta muito. E este não é um quesito em que a Casa de Maranello pode se dizer tranquila. Muito pelo contrário: suas velocidades mais altas em Monte Carlo ficaram a dever de cinco a seis quilômetros por hora aos mais velozes. Nico Rosberg foi quem chegou mais rápido ao trecho mais veloz, a freada após o túnel: 285,1 km/hora; Alonso foi o quinto, 284,2, e Massa o sétimo, 283,8. A diferença é, de fato, pequena, mas tende a crescer exponencialmente à medida em que as velocidades aumentam. Em Barcelona, Romain Grosjean, o mais veloz, chegou a 323,8; Massa, o melhor da Ferrari, foi o 12º, com 316,6; Alonso, o 16º, 315,7. É um déficit além do razoável.
Sim, espera-se um ganho, mas ele nunca permitirá aos Ferrari se equipararem aos Lotus, que foram concebidos com a preocupação de opor resistência mínima à fluidez do ar que atravessa as laterais onde se alojam os radiadores. Isso só é possível por causa da maior capacidade dos motores Renault de conviver com temperaturas altas. Isso permite que os radiadores sejam menos expostos ao fluxo de ar que os da Ferrari, que para garantir as melhores temperaturas de funcionamento do motor dificultam a passagem e o escoamento do ar.
Outro ponto que explica a diferença de velocidade entre as duas marcas é o aerofólio traseiro. O da Renault é concebido para dar maior eficiência ao DRS, sigla que significa sistema de diminuição de resistência aerodinâmica, também chamada de asa móvel. Logo que ela se abre, a resistência do ar ao deslocamento do carro cai significativamente; o preço disso é menor eficiência do aerofólio quando o DRS não é acionado. Na Ferrari, ocorre justamente o oposto: com o DRS acionado, a asa é menos eficiente do que a da Renault; com ele fechado, ela gera mais pressão. Só que a asa é apenas um dos muitos apêndices que formam o conjunto aerodinâmico de um carro, onde a Ferrari continua deficiente...
Por essas e outras, não dá para se ter certeza de que a Ferrari será tão eficiente no Canadá quanto foi em Mônaco. Onde Felipe Massa, mesmo levando um pouco de azar com o trânsito e cometendo um pequeno erro no Q3, foi pouquíssimo mais lento que Alonso. Foi dele, aliás, o melhor tempo da Ferrari, aquele que lhe deu o primeiro lugar na segunda parte do qualify, o Q2. No Q3, onde Massa chegou pela primeira vez neste ano, Alonso foi o sexto e Massa o sétimo.
Há quanto tempo isso não acontecia? Sétimo no grid, o brasileiro voltou a largar bem e chegou à primeira curva lado a lado com Alonso, que havia ganho uma posição no grid graças à punição que deslocou Michael Schumacher da pole position para o sexto lugar. Na corrida, Massa foi perfeito. Pena que aqueles que o precederam também foram. Mesmo assim, se tivesse sido chamado para trocar os pneus duas voltas mais cedo, poderia ter superado Lewis Hamilton. Esta é a da própria Ferrari, que mudou de humores e teceu elogios rasgados ao brasileiro.
Merecidíssimos, aliás, mas não tranquilizadores. Felipe mesmo admitiu, após a bandeirada, que mesmo sem permitir ultrapassagens, Mônaco não permite projeções para o resto do campeonato. E o passado recente mostra que é ele o bode expiatório quando as coisas não andam bem. Principalmente diante do desempenho mais do que perfeito de seu companheiro. Por incrível que possa parecer, considerando o carro de que dispõe, o espanhol lidera sozinho o Mundial, três pontos à frente de, adivinha quem...É isso mesmo, Vettel e Webber, os pilotos de Adrian Newey.
Já lá se foram seis corridas, seis pilotos diferentes ocuparam o degrau mais alto do pódio. Mas aos poucos começa se delinear uma tendência, começam a se definir os candidatos mais fortes na ainda indefinida luta pelo título. São Alonso, o mais eficiente, e Vettel e Webber, os mais bem equipados. Jenson Button e Lewis Hamilton aos poucos perdem a força inicial à medida que se sucedem os erros da McLaren – a equipe inglesa ainda tem o mais alto padrão de engenharia, mas deixa a desejar nos treinos e corridas. A Lotus tem um dos melhores carros, mas tem também as piores escolhas estratégicas – para piorar, perde muito desempenho com as nada raras quedas de temperatura. Williams, Sauber e Force India melhoraram, mas não chegam a ameaçar o quarteto dominante.
Quarteto? Sim, não dá para descartar a Mercedes. Principalmente depois das muitas modificações que exibiram em Mônaco. Laterais mais afiladas, câmbio de fibra de carbono (bem mais leves) nos dois carros, novas suspensões traseiras e pinças de freios recolocadas na parte inferior dos discos, rebaixando o centro de gravidade e propiciando melhor fluxo de ar para o difusor. A inovação aerodinâmica teve pouca utilidade em Mônaco, mas o câmbio permitiu a adoção das novas suspensões traseiras e, também, o reposicionamento das pinças de freios. Tudo isso foi coroado com a pole position inesperada e aplaudidíssima de Schumacher e também com o terceiro tempo de Rosberg. Até o último fim de semana, não havia sido comum os Mercedes largarem tão perto nem tão bem posicionados – e ninguém apostaria um tostão furado na pole do alemão.
Pena que sua corrida foi prejudicada pelo encontrão com o promissor e atabalhoado Grosjean. Não cabe ao jovem franco-suíço nenhuma responsabilidade no ocorrido. Pressionado por um movimento extremamente agressivo por parte de Alonso, que chegou a bater rodas com a Lotus negra e dourada na disputa por uma posição que ganharia ali ou nunca mais. A Grosjean só restou tirar o pé, do que ele nunca cogitou, ou espremer Schumacher. Os dois carros se tocaram e a pior parte ficou para o novato. E também para Kamui Kobayashi, que teve seu Sauber irreparavelmente danificado exatamente na corrida em que largava em uma de suas melhores posições de largada do ano.
Por isso, não foi possível ver até onde poderia ir o inesperado ressurgimento do heptacampeão mundial. Ancorado atrás de Raikkonen, não pôde fazer nada além de seguir o finlandês até problemas de alimentação darem fim à sua corrida. Mais uma dúvida a ser dirimida nas próximas corridas: Schumacher está de volta a seus melhores dias? Sim ou não? Até que ponto? É só na classificação ou pode sustentar a surpresa volta após volta? A Mercedes resolveu, ou ao menos amenizou, o consumo exagerado dos pneus traseiros que mostrou nas etapas anteriores? Só vamos saber disso tudo no Canadá.
Lá também Bruno Senna será examinado de perto. Ele travou conhecimento com o circuito em 2010, nos tempos amargos da equipe Hispania. Sim, o carro era limitadíssimo, não permitia muito mais do que a luta entre seus dois pilotos. Mesmo assim, os dois dias de treinos e as 13 voltas de corrida, foram suficientes para Bruno ter claro em sua mente quais são as exigências da pista de um parque que só é usada uma ou duas vezes por ano. Melhor assim. Afinal, espera-se que desta vez ele venha a fazer o que não tem feito nas duas últimas corridas: dosar melhor a agressividade que o tem levado a desperdiçar no qualify o potencial de um carro que já venceu neste ano.
OK, nem sempre vai-se ver um Williams largando na primeira fila, pode ser até que isso nem se repita neste ano. Mas o desempenho de Pastor Maldonado tem deixado o brasileiro em situação vexatória. O 15º lugar do brasileiro no grid de Mônaco se compara negativamente com o nono tempo do venezuelano – ele depois caiu para os cafundós do grid, mas foi por punições que nada têm a ver a velocidade do carro ou do piloto. Está na hora de Bruno voltar a mostrar serviço. O 10º lugar na corrida monegasca foi um recomeço. Não foi nada brilhante, mas ruim também não chegou a ser. O problema maior é no qualify, é nessa hora que ele precisa mostrar bem mais do que fez até agora. Uma boa oportunidade para isso vai ser daqui a alguns dias, na Île de Notre Dame.
Por tudo isso, e por suas características, o GP do Canadá pode mostrar o que Mônaco não mostrou. Para o bem e para o mal.
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