* Por Rodrigo Mattar
Primeiro como torcedor e depois como jornalista, completo neste ano de 2012 trinta e três temporadas envolvido até o pescoço com essa paixão que significa muito na minha vida, o automobilismo.
E nesse tempo todo, não me recordo de ter visto alguém despertar tamanha dicotomia de amor e ódio por um esportista, como Rubens Barrichello conseguiu em toda sua carreira de piloto.
A primeira vez que ouvi falar dele foi em 1982. Ele tinha nove anos, eu dez. Já leitor voraz de Auto Esporte e Quatro Rodas, em tempos pré-internet, a cobertura esportiva era farta, detalhada e completa. E no Brasileiro de Kart daquele ano, lá estava o Rubens duelando com outros meninos da então chamada Quarta Menor numa pista em Foz do Iguaçu, no Paraná.
Nos anos seguintes, acompanhei a ascensão daquela jovem promessa do automobilismo, que colecionava vitórias e títulos nos micromonopostos até chegar, aos 17 anos de idade, na Fórmula Ford. Com o JQ-Reynard pintado com o indefectível #11 e preparado por Elísio Casado, ele venceu logo na estreia em Florianópolis, num circuito de rua. Eu era um dos telespectadores que acompanhou o feito daquele menino no dia 21 de abril de 1989.
A natural passagem para o automobilismo internacional aconteceu através da Fórmula Opel e ele não decepcionou. Foi campeão europeu da categoria e na temporada seguinte, num ano repleto de títulos do automobilismo brasileiro no exterior, ganhou a Fórmula 3 inglesa. Só na Fórmula 3000, degrau imediatamente inferior à F-1 naqueles tempos, é que não pudemos vê-lo vencer. Culpa de um equipamento apenas razoável e de um Luca Badoer endiabrado e tido como o novo
enfant gaté do automobilismo italiano.
O tempo se encarregaria de pôr as coisas no lugar e enquanto Badoer jamais marcou um único ponto na Fórmula 1, Barrichello construiu uma trajetória muito interessante pelos 19 anos seguintes.
Com acertos e erros, o piloto começou a despertar simpatia em muitos fãs que viam nele qualidades que saltavam aos olhos, como a capacidade natural de acertar um carro, a constância, a regularidade e a pouca propensão a erros e acidentes.
Mas, por outro lado, começaram as críticas, as cobranças descabidas e em muitas ocasiões, o próprio Rubens dava munição aos detratores. Quando decidiu pegar para si a responsabilidade de manter o Brasil no topo da Fórmula 1, não deu certo. Aos 23 anos em 1995, talvez ele não estivesse preparado psicológica e tecnicamente para esse desafio. Faltava-lhe carro, sobrava-lhe boa vontade.
Ao ser demitido da Jordan, encontrou em Jackie Stewart, para quem guiara em 1990 na Fórmula Opel, um professor fora de série e um porto seguro para uma carreira que parecia nunca decolar. E mesmo sem ter vencido no único triunfo do time britânico em Nürburgring, façanha que coube a Johnny Herbert, Rubens fez saltar aos olhos da Ferrari todas as suas qualidades, que o alavancaram à condição de primeiro brasileiro desde José Carlos Pace a guiar um carro da marca em qualquer competição internacional de automobilismo.
O problema para Rubens era quem dividia o boxe da tradicional escuderia italiana com ele: Michael Schumacher. Acredito que ele tenha tido ótimos momentos na Ferrari, mas alguns outros de total desconforto, como o fatídico 11 de maio de 2002, na Áustria. E lá, cunhou frases de efeito que não foram felizes, como o “sou apenas um brasileirinho lutando contra o mundo todo”, que provocaram a fúria da imprensa e uma torrente de críticas – inclusive minhas – contra uma postura de quem aceitava passivamente um papel de segundo piloto que, a julgar por suas palavras, não lhe cabia.
Errou ao não aceitar uma proposta da Williams para ser piloto do time em 2003 e perdeu ali uma chance de brigar de verdade para ser campeão mundial de Fórmula 1. Acabou vítima das falhas da Honda, que fez dois carros horrorosos por dois anos seguidos e quase afundou a carreira dele e a de Jenson Button. E quando todos acreditavam que ele faria parte de um passado nada remoto já em 2009, veio a Brawn GP e o salvou.
Ali, Barrichello teve mais uma chance de verdade para ser campeão mundial. E não teve a sorte para aproveitá-la. Competência, nunca lhe faltou. Tanto que a última vitória de qualquer piloto brasileiro na Fórmula 1 é dele, há quase três anos, no GP da Itália, em Monza.
Mas, que diabos!, com o mesmo carro Jenson Button levou seis troféus nas sete primeiras provas daquele ano para casa e foi, merecidamente, campeão.
Nos últimos dois anos, Barrichello tentou fazer seu melhor numa Williams que não é mais a mesma de quando ele recusou uma proposta em 2003. Na época, havia os motores BMW. Havia Patrick Head totalmente focado no time. Hoje, não. Os motores são os Cosworth, sem vínculo com nenhuma indústria automobilística. E pouco a pouco, Head veio se desinteressando e se cansando da Fórmula 1 de tal forma que não estará mais à frente das operações do time em 2012.
Os anos passam, a Fórmula 1 mudou muito, mas a pessoa e o caráter de Rubens Barrichello permaneceram os mesmos, imutáveis. Ele é a prova do quanto uma pessoa pode acreditar em si mesma e permanecer na ativa, fazendo o que mais gosta na vida, por tanto tempo e sendo capaz de atrair, como disse anteriormente, a admiração de milhares de pessoas como também o inconformismo de uma minoria insatisfeita por ver que ele não conseguiu repetir os feitos de Fittipaldi, Piquet e Senna.
Fosse em outro país e Rubens Barrichello seria realmente valorizado como ele mereceria. Se ele se der ao trabalho de fazer um exame de consciência, não tem absolutamente nada do que reclamar do que fez no automobilismo. E se for preciso, erguer a cabeça, olhar para a frente, agradecer pelos 19 anos vividos na Fórmula 1, que lhe deram dinheiro, fama, dois filhos e um casamento sólido, e vislumbrar no horizonte um novo caminho em sua vida de piloto.
Rubens tem algumas boas opções para continuar competindo até os 50 anos, se quiser, e ainda se divertir e ser feliz.
Vai, Barrichello, vai ser
gauche na vida.
2 comentários:
Há vida sim fora da F1, só espero que ele não vá para a Stock lixo...
Indy, Barrica, Indy...
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