terça-feira, 6 de março de 2012
WURZ E A FUNÇÃO DO "PILOTO-MENTOR"*
Por Edd Straw - do Autosport.com
É normal que os melhores atletas no futebol, no tênis, no golfe ou em qualquer outro esporte de alto rendimento tenham técnicos. Apenas na F1, a ideia de um técnico para pilotos – ou um “mentor de pilotos”, como foi chamada a nova contratação da Williams, Alex Wurz – é estranha, mesmo que a prática seja habitual na maioria das categorias júnior. Excepcionalmente, o ex-piloto austríaco agora está ligado à equipe britânica como um consultor, cuja principal função será trabalhar com Pastor Maldonado, Bruno Senna e o reserva Valtteri Bottas.
Mas afinal, do que se trata realmente o trabalho? Bom, em primeiro lugar, o trabalho de Wurz ainda está no início, mas a tarefa do austríaco é muito clara. O austríaco de 38 anos, que disputou sua última prova em 2007, venceu as 24 Horas de Le Mans para a Peugeot e agora foi contratado pela Toyota, não está ali para ensinar o óbvio do cargo.
“Primeiro de tudo, eles são pilotos de alta qualidade”, disse Wurz. “Venceram provas na GP2, que é uma categoria muito competitiva, e possuem grandes habilidades como pilotos de F1. Mas compare a situação aos melhores atletas em todos os esportes; é normal Tiger Woods e Roger Federer terem um mentor ou um treinador. Tenho certeza que o técnico de Tiger não joga tão bem quanto ele, mas conhece sua personalidade, sabe como ele pensa. Então, é como se fosse um par de olhos extra ou um cérebro extra.”
“Nesta questão, a F1 é um dos últimos esportes que ainda não se envolveram nesse tipo de otimização de desempenho, para usar uma frase de Ron Dennis. O fato de a Williams ter dado este passo inovador é algo bem legal. O desenvolvimento do processo vai depender do piloto. Alguns deles não precisam de nada durante o fim de semana inteiro ou até a temporada porque estão no seu auge, mas pode haver casos onde minha experiência e meus milhões de quilometragem poderão ajudar.”
“A F1 é meio que um mundo machista onde os pilotos devem ser máquinas quando entram no carro e terem um desempenho perfeito. A perfeição, no entanto, sempre precisa de um pouco de ajuda aqui e ali.”
O próprio Wurz entende a dificuldade de procurar a ajuda certa como um piloto de F1. Em sua carreira de 69 GPs, o australiano acredita que poderia ter sido mais beneficiado se fosse aconselhado por alguém no cargo de piloto-mentor. Wurz não percebeu a situação, no entanto, até retornar ao endurance em 2008.
“Na F1, você fica preso à forma como as coisas operam, isto é, dentro da mesma caixa com nenhuma ideia lateral fora disso. Percebi logo no início que isto seria útil, mas nunca houve nada parecido com o que estou fazendo agora.”
Durante o período com a equipe, Wurz vai trabalhar de forma paralela com os engenheiros – e não como parte deles. Ele participou dos testes em Barcelona como consultor de Senna, Maldonado e Bottas e se viu discutindo todo tipo de assunto com os pilotos. Além do mais, ele já tem uma ideia de como terá de se adaptar para trabalhar com cada um.
“O pessoal do departamento técnico tem seu próprio funcionamento e eu apenas lido com os pilotos. Há diferentes estágios para os pilotos. Talvez nosso jovem piloto finlandês, Valtteri, precise mais deste tipo de informação do que Bruno, que já é bem educado, mas ainda posso transmitir informação. Ficarei feliz em ajudar com o que eles precisarem.”
Em Barcelona, Wurz passou uma boa parte do tempo na pista para entender o trabalho dos pilotos e provar o valor de se ter um par extra de olhos disponível para fornecer informações ao homem no cockpit.
Isso não significa, porém, que ele forçará seu feedback aos pilotos. Em vez disso, Wurz prefere se munir de todo tipo de informação possível quando eles precisarem dele.
“Se o piloto está aberto a isso como uma informação extra, então ficarei mais do que feliz para me aprofundar nestes detalhes. Não quero invadir o mundo deles. Na verdade, esse seria o pior erro que poderia cometer agora, porque eles são os melhores pilotos do mundo. Seria uma manobra suicida se eu tentasse ensiná-los como pilotar o carro. Era melhor ficar em casa.”
O mundo do automobilismo é cheio de exemplos de ex-pilotos que mais atrapalharam do que ajudaram na hora de transmitir conhecimento. E alguns exemplos vêm de competidores com currículos mais ilustres em comparação com Wurz que, mesmo tão bom, conquistou apenas três pódios na carreira.
Um velho ditado diz que os maiores expoentes do esporte são os piores técnicos. A ideia é de que os melhores frequentemente aprendem seu ofício de forma tão rápida que trabalham em um nível subconsciente antes mesmo de perceber o que fazem. Nesta situação, um grande piloto pode ter dificuldades para entender o que eles tentam comunicar.
De acordo com o mesmo princípio, aqueles que trabalham duro em seu ofício têm uma melhor capacidade de transmitir conhecimento, pois se submeteram a um processo de aprendizado mais longo. Wurz tem uma grande simpatia pela ideia, mesmo se ela inevitavelmente o enquadra em um rol de pilotos que não estavam no ritmo dos grandes na F1 à sua época.
“Você diz que os melhores pilotos e esportistas não são os melhores técnicos. No geral, concordo contigo mas nem sempre isso é certo. Um dos melhores pilotos de todos os tempos, Walter Rohrl, foi um técnico absolutamente deslumbrante”, disse Wurz.
“Conversei com vencedores de GPs e até campeões mundiais quando trabalhei na TV e perguntei a eles por que eles não faziam tal coisa, porque às vezes vi algo que eles ignoraram. Um bom exemplo aconteceu com um recente campeão mundial em uma sexta-feira, no último GP do Brasil. Disse algo e isso o ajudou a perceber que ele estava criando um problema [com o carro] ao tentar resolvê-lo com mudanças no acerto. Ele se adaptou à situação e ficou mais rápido.”
“Claro, eu não fui tão rápido quanto esse cara, mas tive tempo no treino livre para observá-lo, enquanto ele e seus engenheiros tinham uma enorme carga de trabalho, e notei essa pequena coisa. Mesmo os melhores podem fazer uso disso.”
Wurz já ressaltou que o treinamento de pilotos é frequentemente negligenciado em um nível superior. Ao mesmo tempo, torna-se cada vez mais essencial. Desde o banimento dos testes durante a temporada em 2009 (embora neste ano uma sessão de três dias em Mugello esteja prevista no calendário), o tempo de pista é escasso.
Toda vez que o piloto vai à pista, há um programa para cumprir. Há pouco tempo para se concentrar em performance individual, algo visto como um aspecto secundário. Some a isso as condições mistas de pista para cada piloto nos seis dias de pré-temporada e o trabalho na prática é pouco significativo.
“Os testes são muito limitados. E não é apenas a quantidade de dias, mas aqui em Barcelona, por exemplo, você começa o dia com uma temperatura de 6º C, o que restringe sua opção de pneus. Na verdade, um dia se resume a talvez duas horas de trabalho, quando a pista fica estabilizada. A quantidade de voltas limpas é muito pequena”, disse Wurz.
“O resto sempre é meio que uma zona cinzenta, onde o vento muda, a pista muda e o carro muda entre as saídas. Há tantas variáveis que os pilotos não têm tempo para aprender.”
Resta ver como a ousada ideia da Williams funcionará. Não há dúvidas de que a ideia é sólida e o homem selecionado – alguém experiente, analítico e tranquilo como Wurz – tem os atributos necessários para a tarefa. Provavelmente, o projeto vai depender de como os pilotos vão recebê-lo. Com base nas evidências até agora, a coisa vai funcionar.
E se for o caso, é possível que Wurz seja o homem que mude as opiniões e torne a função de piloto-técnico uma parte formal da F1. O que antes era feito de forma ocasional pode se tornar tão natural como a figura de um técnico no campo de futebol.
Além do mais, se Wurz extrair um pouco de desempenho a mais dos pilotos – mesmo que seja um pouco mais de consistência somada a uma pequena fração de segundo –, seu trabalho provavelmente custará menos do que uma incursão técnica no carro.
“Quando falei a Williams sobre isso, disse-lhes que espero me tornar a forma mais fácil e barata de se ganhar um tempo de volta. Talvez não encontremos isso em puro tempo de volta, talvez a ideia seja a consistência. O que quer que seja, ela pode melhorar o desempenho do piloto.”
E este será o fator decisivo para saber se a experiência vai funcionar. Como Wurz disse, o cronômetro não mente e, se os pilotos da Williams desenvolverem seu jogo neste ano, provavelmente ele terá uma mão nisso.
E isso pode levar seu novo cargo a se tornar um padrão da indústria, mesmo para as equipes de ponta, que trabalham com os melhores pilotos no negócio.
É normal que os melhores atletas no futebol, no tênis, no golfe ou em qualquer outro esporte de alto rendimento tenham técnicos. Apenas na F1, a ideia de um técnico para pilotos – ou um “mentor de pilotos”, como foi chamada a nova contratação da Williams, Alex Wurz – é estranha, mesmo que a prática seja habitual na maioria das categorias júnior. Excepcionalmente, o ex-piloto austríaco agora está ligado à equipe britânica como um consultor, cuja principal função será trabalhar com Pastor Maldonado, Bruno Senna e o reserva Valtteri Bottas.
Mas afinal, do que se trata realmente o trabalho? Bom, em primeiro lugar, o trabalho de Wurz ainda está no início, mas a tarefa do austríaco é muito clara. O austríaco de 38 anos, que disputou sua última prova em 2007, venceu as 24 Horas de Le Mans para a Peugeot e agora foi contratado pela Toyota, não está ali para ensinar o óbvio do cargo.
“Primeiro de tudo, eles são pilotos de alta qualidade”, disse Wurz. “Venceram provas na GP2, que é uma categoria muito competitiva, e possuem grandes habilidades como pilotos de F1. Mas compare a situação aos melhores atletas em todos os esportes; é normal Tiger Woods e Roger Federer terem um mentor ou um treinador. Tenho certeza que o técnico de Tiger não joga tão bem quanto ele, mas conhece sua personalidade, sabe como ele pensa. Então, é como se fosse um par de olhos extra ou um cérebro extra.”
“Nesta questão, a F1 é um dos últimos esportes que ainda não se envolveram nesse tipo de otimização de desempenho, para usar uma frase de Ron Dennis. O fato de a Williams ter dado este passo inovador é algo bem legal. O desenvolvimento do processo vai depender do piloto. Alguns deles não precisam de nada durante o fim de semana inteiro ou até a temporada porque estão no seu auge, mas pode haver casos onde minha experiência e meus milhões de quilometragem poderão ajudar.”
“A F1 é meio que um mundo machista onde os pilotos devem ser máquinas quando entram no carro e terem um desempenho perfeito. A perfeição, no entanto, sempre precisa de um pouco de ajuda aqui e ali.”
O próprio Wurz entende a dificuldade de procurar a ajuda certa como um piloto de F1. Em sua carreira de 69 GPs, o australiano acredita que poderia ter sido mais beneficiado se fosse aconselhado por alguém no cargo de piloto-mentor. Wurz não percebeu a situação, no entanto, até retornar ao endurance em 2008.
“Na F1, você fica preso à forma como as coisas operam, isto é, dentro da mesma caixa com nenhuma ideia lateral fora disso. Percebi logo no início que isto seria útil, mas nunca houve nada parecido com o que estou fazendo agora.”
Durante o período com a equipe, Wurz vai trabalhar de forma paralela com os engenheiros – e não como parte deles. Ele participou dos testes em Barcelona como consultor de Senna, Maldonado e Bottas e se viu discutindo todo tipo de assunto com os pilotos. Além do mais, ele já tem uma ideia de como terá de se adaptar para trabalhar com cada um.
“O pessoal do departamento técnico tem seu próprio funcionamento e eu apenas lido com os pilotos. Há diferentes estágios para os pilotos. Talvez nosso jovem piloto finlandês, Valtteri, precise mais deste tipo de informação do que Bruno, que já é bem educado, mas ainda posso transmitir informação. Ficarei feliz em ajudar com o que eles precisarem.”
Em Barcelona, Wurz passou uma boa parte do tempo na pista para entender o trabalho dos pilotos e provar o valor de se ter um par extra de olhos disponível para fornecer informações ao homem no cockpit.
Isso não significa, porém, que ele forçará seu feedback aos pilotos. Em vez disso, Wurz prefere se munir de todo tipo de informação possível quando eles precisarem dele.
“Se o piloto está aberto a isso como uma informação extra, então ficarei mais do que feliz para me aprofundar nestes detalhes. Não quero invadir o mundo deles. Na verdade, esse seria o pior erro que poderia cometer agora, porque eles são os melhores pilotos do mundo. Seria uma manobra suicida se eu tentasse ensiná-los como pilotar o carro. Era melhor ficar em casa.”
O mundo do automobilismo é cheio de exemplos de ex-pilotos que mais atrapalharam do que ajudaram na hora de transmitir conhecimento. E alguns exemplos vêm de competidores com currículos mais ilustres em comparação com Wurz que, mesmo tão bom, conquistou apenas três pódios na carreira.
Um velho ditado diz que os maiores expoentes do esporte são os piores técnicos. A ideia é de que os melhores frequentemente aprendem seu ofício de forma tão rápida que trabalham em um nível subconsciente antes mesmo de perceber o que fazem. Nesta situação, um grande piloto pode ter dificuldades para entender o que eles tentam comunicar.
De acordo com o mesmo princípio, aqueles que trabalham duro em seu ofício têm uma melhor capacidade de transmitir conhecimento, pois se submeteram a um processo de aprendizado mais longo. Wurz tem uma grande simpatia pela ideia, mesmo se ela inevitavelmente o enquadra em um rol de pilotos que não estavam no ritmo dos grandes na F1 à sua época.
“Você diz que os melhores pilotos e esportistas não são os melhores técnicos. No geral, concordo contigo mas nem sempre isso é certo. Um dos melhores pilotos de todos os tempos, Walter Rohrl, foi um técnico absolutamente deslumbrante”, disse Wurz.
“Conversei com vencedores de GPs e até campeões mundiais quando trabalhei na TV e perguntei a eles por que eles não faziam tal coisa, porque às vezes vi algo que eles ignoraram. Um bom exemplo aconteceu com um recente campeão mundial em uma sexta-feira, no último GP do Brasil. Disse algo e isso o ajudou a perceber que ele estava criando um problema [com o carro] ao tentar resolvê-lo com mudanças no acerto. Ele se adaptou à situação e ficou mais rápido.”
“Claro, eu não fui tão rápido quanto esse cara, mas tive tempo no treino livre para observá-lo, enquanto ele e seus engenheiros tinham uma enorme carga de trabalho, e notei essa pequena coisa. Mesmo os melhores podem fazer uso disso.”
Wurz já ressaltou que o treinamento de pilotos é frequentemente negligenciado em um nível superior. Ao mesmo tempo, torna-se cada vez mais essencial. Desde o banimento dos testes durante a temporada em 2009 (embora neste ano uma sessão de três dias em Mugello esteja prevista no calendário), o tempo de pista é escasso.
Toda vez que o piloto vai à pista, há um programa para cumprir. Há pouco tempo para se concentrar em performance individual, algo visto como um aspecto secundário. Some a isso as condições mistas de pista para cada piloto nos seis dias de pré-temporada e o trabalho na prática é pouco significativo.
“Os testes são muito limitados. E não é apenas a quantidade de dias, mas aqui em Barcelona, por exemplo, você começa o dia com uma temperatura de 6º C, o que restringe sua opção de pneus. Na verdade, um dia se resume a talvez duas horas de trabalho, quando a pista fica estabilizada. A quantidade de voltas limpas é muito pequena”, disse Wurz.
“O resto sempre é meio que uma zona cinzenta, onde o vento muda, a pista muda e o carro muda entre as saídas. Há tantas variáveis que os pilotos não têm tempo para aprender.”
Resta ver como a ousada ideia da Williams funcionará. Não há dúvidas de que a ideia é sólida e o homem selecionado – alguém experiente, analítico e tranquilo como Wurz – tem os atributos necessários para a tarefa. Provavelmente, o projeto vai depender de como os pilotos vão recebê-lo. Com base nas evidências até agora, a coisa vai funcionar.
E se for o caso, é possível que Wurz seja o homem que mude as opiniões e torne a função de piloto-técnico uma parte formal da F1. O que antes era feito de forma ocasional pode se tornar tão natural como a figura de um técnico no campo de futebol.
Além do mais, se Wurz extrair um pouco de desempenho a mais dos pilotos – mesmo que seja um pouco mais de consistência somada a uma pequena fração de segundo –, seu trabalho provavelmente custará menos do que uma incursão técnica no carro.
“Quando falei a Williams sobre isso, disse-lhes que espero me tornar a forma mais fácil e barata de se ganhar um tempo de volta. Talvez não encontremos isso em puro tempo de volta, talvez a ideia seja a consistência. O que quer que seja, ela pode melhorar o desempenho do piloto.”
E este será o fator decisivo para saber se a experiência vai funcionar. Como Wurz disse, o cronômetro não mente e, se os pilotos da Williams desenvolverem seu jogo neste ano, provavelmente ele terá uma mão nisso.
E isso pode levar seu novo cargo a se tornar um padrão da indústria, mesmo para as equipes de ponta, que trabalham com os melhores pilotos no negócio.
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Um comentário:
Técnico de F1 - Só não sabe o quanto...
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