terça-feira, 12 de março de 2013
O que espero das cinco grandes depois dos testes de pré-temporada*
* Por Lívio Oricchio
Olá amigos, coloco no ar o post sobre o último teste de Barcelona apenas agora, quinta-feira de manhã, e não ontem, conforme combinamos, porque precisei me estender um pouco mais na preparação para a longa viagem a Austrália, Malásia, China e Bahrein, as quatro primeiras etapas do campeonato.
Antes de falarmos propriamente do último ensaio no Circuito da Catalunha, gostaria de fazer alguma considerações sobre a pré-temporada em si. Senhores, tenha a certeza de que na sexta-feira, dia 15, lá no circuito Albert Park, em Melbourne, todos os carros vão estar na pista o máximo de tempo possível. Não vai ter essa de ficar parado economizando pneus. Não creio, ao menos.
A razão é simples: será provavelmente a primeira vez que as equipes vão poder conhecer como seus carros se comportam sob temperaturas compatíveis com as que enfrentarão durante o campeonato. Nos treinos de inverno houve um único dia, o último, em que o asfalto se aproximou dos 20 graus, ainda assim abaixo dos mais de 30 usuais ao longo do calendário.
Os pneus Pirelli são compostos por uma porcentagem de borracha natural e outra sintética, química. A indústria de pneus funciona assim. E para ativar algumas das substâncias que os compõem é necessário atingir determinada temperatura. Por isso a Pirelli informa os times qual a faixa de temperatura para o uso. Abaixo disso, como foi em todos os testes, essas substâncias não são ativadas e, claro, o grau de aderência é bem menor.
Sendo menor, o carro escorrega mais, provocando rápido e elevado desgaste da banda de rodagem. Vimos no paddock de Jerez de la Frontera e Barcelona os pneus sendo lavados, depois de saírem dos carros, e era impressionante. Agora no circuito Albert Park, com o asfalto próximo dos 30 graus, caso não chova, os pilotos e seus engenheiros vão compreender com esses novos pneus funcionam de verdade.
Quer saber? Ouvi de muita gente no paddock que deveremos ter belas surpresas na primeira etapa do Mundial, como de Ross Brawn, da Mercedes, e Pat Fry, Ferrari. Não que a imagem da Fórmula 1 exposta na pré-temporada não tenha servido para nada e, de repente, alguém que está lá atrás passe a competir entre os primeiros, mas podemos, sim, assistir a uma disputa um pouco distinta da sugerida pelos testes.
Por exemplo: a Mercedes andou muito bem em Barcelona. Hamilton e Rosberg estabeleceram o primeiro e o terceiro tempo, em absoluto, além de a escuderia ficar atrás apenas da Sauber em quilômetros percorridos. Mas eu me lembro do ensaio do ano passado e, da mesma forma, sob temperatura mais baixa, a Mercedes andou muito bem. E mesmo na etapa de Melbourne, no meio da pista, o carro me impressionou.
Cheguei a escrever, depois de assistir às sessões livres no S de alta, que estava faltando piloto para a organização alemã. O modelo W03 na mão de Vettel, Hamilton ou Alonso seria um potencial vencedor da corrida. Mas depois a Mercedes se perdeu no seu desenvolvimento. Andou bem, apenas, no GP da China, quando enfrentamos um frio inesperado.
Torço para não ser o caso, agora, e Hamilton e Rosberg se insiram mesmo dentre os candidatos regulares à vitória. Seria ótimo para a Fórmula 1. Em resumo, amigos, o que desejo dizer é que a ordem de forças anunciada pelos cerca de 5 mil quilômetros acumulados pelas equipes pode se mostrar um pouco distinta. O que é ótimo. O interesse pelo GP da Austrália já é ainda maior do normal.
A seguir, vamos passear pelo trabalho de cada equipe e piloto ao longo do mês de preparação para o campeonato. Os dados estatísticos eu mesmo os apurei, a partir dos números distribuídos nas salas de imprensa dos autódromos de Jerez e Barcelona, refiro-me à ordem dos tempos e número de voltas em cada traçado. A saber, Jerez com 4.428 metros e Barcelona, 4.655 metros.
Red Bull
Quilômetros percorridos nos três testes: 4.607,4 (5.ª melhor)
Se a ordem era esconder o jogo, foi cumprida com perfeição teutônica. No último teste, os mecânicos ensaiaram uma coreografia para recepcionar o carro que se aproximava dos boxes. Com movimentos sincronizados, o cercavam com os painéis móveis, rapidamente, para ninguém ter tempo de observá-lo ou, pior, registrar fotografias.
Vi Vettel e Webber não comandarem o DRS, o flap móvel, na reta dos boxes em Barcelona, a fim de não ganharem os cerca de 3/10 que o recurso oferece, por se tratar de uma reta de 1.097 metros. Como escrevi da outra vez, da sala de imprensa temos uma visão superior dos carros por a parede que a separa da pista ser de vidro e construída bastante inclinada. Pode-se ver o que está abaixo.
Não tenho metade dos olhos de lince de Giorgio Piola para ver e entender o que mudou em relação ao que existia nos carros. Desculpe, metade é muita pretensão; 20%, se tanto. Mas Adrian Newey, na última versão do conjunto traseiro do RB9-Renault, criou laterais que conduzem o ar e os gases do escape com eficiência ainda maior para o difusor, a curvatura na parte final do assoalho.
O difusor, por sinal, era também novo. Os técnicos o pintaram com a característica tinta verde, concebida para identificar o direcionamento dos fluxos de ar que se deslocam pela superfície. Toda a encenação para esconder o segredo relaciona-se, provavelmente, com alguma solução que Newey introduziu no conjunto aerodinâmico traseiro.
Curiosamente, vi Vettel ficar um pouco para trás quando estava na pista ao mesmo tempo que Alonso com a Ferrari F138, domingo, instante em que usavam os pneus duros em um long run. Não estou dizendo, por favor, que a Red Bull está atrás da Ferrari. Penso o contrário. E há muitos fatores que podem explicar Vettel estar mais lento naquele momento, como estado dos seus pneus, volume de combustível no tanque ou mesmo estratégia.
Para quem analisa os tempos nas séries de 12 a 15 voltas, com pneus médio e macios da Pirelli, a Red Bull sugere estar melhor não só que a Ferrari mas todos os demais. A longa e veloz curva 3 de Barcelona é bastante reveladora da maior eficiência aerodinâmica do seu monoposto, RB9-Renault, lindo, por sinal.
Por conta de a Infiniti ter estabelecido com a Red Bull um acordo de parceria técnica e patrocínio em bases bem mais amplas dos anos anteriores, o azul escuro do time austríaco ficou um pouco diferente, menos escuro e mais para o roxo. É uma cor que os italianos têm medo. A associam à morte.
Mas a Red Bull está bem viva e seria uma surpresa para todos se não lutasse pela pole position e a vitória na abertura do Mundial. Não vejo, contudo, uma vantagem técnica significativa no modelo RB9 em relação aos concorrentes. Vettel nos disse não saber como interpretar o comportamento do RB9 domingo, em Barcelona, em razão de os pneus estarem tão fora das especificações para os quais foram projetados.
Análise de um integrante de outra escuderia, mas de relação muito próxima a da Red Bull: “Você opta por um acerto e vai para a pista. As reações são opostas às esperadas. Acontece. Muda a partir dos dados que obtém, regressa à pista acreditando que aquilo vai melhorar o carro e, de novo, o resultado é distinto. A única explicação que encontramos para essa falta de lógica é o mau funcionamento dos pneus por causa da temperatura baixa”.
Foi isso o que Vettel comentou, embora com menos detalhes, no Circuito da Catalunha, domingo. Esse quadro mostra que até mesmo a organização de melhor conjunto na pré-temporada vai para Melbourne com dúvidas profundas, como os demais.
Sebastian Vettel
Quilômetros percorridos na pré-temporada: 2.342,9 (11.º)
Melhor tempo em Barcelona: 1min22s197, pneus macios (12.º), dia 20/02.
Sem nenhum demérito para Mark Webber, que é um bom piloto. Mas uma coisa é você estar na pista para ver de perto o comportamento dos carros e observar um e outro piloto na condução do RB9. O alemão freia mais dentro, leva mais velocidade para dentro da curva, permanece menos tempo com o pé fora do acelerador.
Com o tempo você se educa a detectar essas diferenças pequenas entre as pilotagens. Compreende-se rapidamente o nível superior de condução de Vettel, uma arte. Dedicado e detalhista, como sempre, começa o ano, para mim, como o piloto com mais chances de surgir na fase final do campeonato em condições de lutar pelo título, o quarto seguido na brilhante carreira.
Mark Webber
Quilômetros percorridos na pré-temporada: 2.264,5 (14.º)
Melhor tempo em Barcelona: 1min22s658 (16.º), pneus macios, dia 02/03.
Sabe que somente uma temporada irretocável o manterá na Red Bull em 2014. O australiano conversa com você nas entrevistas como se batesse um papo, foge o padrão formal da Fórmula 1. Se você o parar no paddock e lhe fizer uma pergunta não te deixa sem resposta. Webber gostou do comportamento do RB9 embora, como todos, deixasse em aberto uma opinião final sobre o carro. “Claramente é melhor que o de 2012. Quanto ainda não dá para saber. Vamos esperar até a China.” Seria surpreendente vê-lo disputar o campeonato, ainda que me deixasse contente.
Ferrari
Quilômetros percorridos na pré-temporada: 4.912,9 (3.ª)
Fernando Alonso não poderia ter sido mais explícito na sua análise: “No GP do Brasil do ano passado (última etapa) estávamos a 7 ou 8 décimos de segundo atrás da Red Bull e da McLaren, os melhores. Nosso objetivo este ano era reduzir essa diferença para 2 ou 3 décimos. Depois dos testes posso responder que atingimos nosso objetivo”. Portanto, a Ferrari avançou e, segundo o melhor piloto em atividade, mais que os concorrentes.
A Ferrari talvez tenha sido o time que mais melhorou o monoposto do primeiro ensaio em Jerez para o último. Em Barcelona, sábado, Felipe Massa deixou os boxes com um novo e sofisticado aerofólio dianteiro, difusor e novas laterais. É impressionate o número de flaps que estamos vendo este ano no aerofólio dianteiro. Flap é aquele perfil de asa instalado depois do perfil alar principal.
A porção final, onde se encontra o terminal de escape, ficou bem mais baixa. Mas a forma de gerar pressão é distinta da solução da Red Bull e, este ano, Lotus, onde os terminais exalam os gases tangenciando a carenagem, direcionando-os diretamente para o difusor. A escola da Ferrari é a da McLaren. Os gases são expelidos mais para a lateral. E quem faz o trabalho maior de direcioná-los para o difusor é o ar em alta velocidade que flui por ali. As duas soluções parecem funcionar bem. Tudo depende de como o projeto, em geral, é concebido.
O fato é que a Ferrari não deverá sofrer para chegar no Q3 nas primeiras etapas, como em 2012. E na simulação de corrida Massa fez séries de voltas com os pneus médios bastante respeitáveis para a condição do treino. Não apresentou, porém, o mesmo desempenho da Lotus de Grosjean no mesmo exercício. Se tivesse de apostar, tendo comigo tudo o que vi, diria que Alonso e Massa devem dispor de um carro para lutar pelo pódio no início da temporada. “Na China vamos ter um grande pacote novo”, explicou Pat Fry, em Barcelona.
Fernando Alonso
Quilômetros percorridos na pré-temporada: 2.3560,7 (10.º)
Melhor tempo em Barcelona: 1min20s494 (2.º), pneus macios, dia 03/03.
Sua determinação impressiona. No futebol corresponderia àquele jogador que toca sempre a bola no sentido do gol e não para as laterais. Adotou, contudo, um discurso perigoso, lançando sobre si responsabilidade ainda maior da que possui, ao afirmar aos quatro cantos que vai lutar pelo título. “Se em 2012 começamos o ano com um carro que era de 1,5 a 2 segundos mais lentos e na etapa final tínhamos chances de vencermos o campeonato, agora, partindo de uma base 200 vezes melhor, nossas possibilidades são ainda maiores”, afirmou o asturiano.
Depois do primeiro teste em Barcelona, de 19 a 22 de fevereiro, o primeiro de Alonso por não ter participado do ensaio de Jerez, deixou o circuito com cara de quem esperava mais do F138. Conheço profissionalmente Alonso desde quando corria na Fórmula 3000, em 2000, e tinha apenas 19 anos de idade. Dá para saber quando está satisfeito ou louco da vida, apesar de procurar não transparecer.
Mas o Alonso que vimos domingo e a Ferrari gentilmente não permitiu falar com a imprensa era outro. Aliás, uma parágrafo. Há patrocinadores que perderam a noção de limite. E escuderias que, por conta dessa relação com o investidor, da mesma forma perderam a noção do que é o mundo profissional, do que deve ser respeitada a relação com a imprensa. Refiro-me ao Banco Santander e à Ferrari.
Massa e Alonso não poderiam conversar conosco, depois do último teste antes do embarque para a Austrália, porque estavam escalados para o evento promocional programado pelo banco para a segunda-feira, um dia depois de encerrada a pré-temporada, também no Circuito da Catalunha. Em outras palavras, quem desejasse ouvir os pilotos deveria, necessariamente, prestigiar a ação do banco no autódromo.
Não vou entrar no mérito de que tudo deve ter sido bem organizado e seria uma bela oportunidade de andar ao lado de Alonso e Massa, com o modelo Ferrari 458 Italia, no traçado catalão. Não é essa a questão, mas por qual razão nos dias dos testes não disponibilizaram os pilotos para os jornalistas? Por que motivo temos compulsoriamente de estar presente num evento promocional para fazer perguntas aos pilotos? Mais: pagar uma diária a mais de hotel e no aluguel do carro.
Se os jornalistas fossem unidos, ninguém deveria ir a ação do banco. E que se divertissem entre eles. Claro que para o Santander é absolutamente irrelevante estarmos ou não no evento, sequer sabem da nossa existência, mas ao menos com a minha consciência fiquei em paz ao embarcar na segunda-feira de manhã para casa, em Nice, de onde escrevo agora.
Se tivessem escalado Alonso e Massa para falar conosco sábado e domingo, depois do seus últimos treinos, e nos lembrassem depois da programação do evento de segunda-feira teria sido profissional, simpático e convidativo. Seria o esperado de empresas da dimensão de um banco como o Santander e uma fabricante de carros do nível da Ferrari. Mas nada disso aconteceu.
Voltando. Em vez de um parágrafo, como escrevi, redigi cinco. Alonso tinha outra expressão depois de completar 120 voltas, o equivalente a quase dois Gps, domingo. Simulou uma classificação e registrou bela marca, a segunda do teste, ainda que não tivesse com o tanque com tão pouca gasolina, segundo ouvi no paddock. Alonso dedicou-se, ainda, na hora final, a operações de pit stop. Dava uma ou duas voltas e reentrava nos boxes, bem abaixo da sala de imprensa, o que nos permitiu ter uma visão espetacular de toda movimentação.
Senhores, os times estão superpreparados para enfrentar uma temporada com mais pit stops do ano passado. Eles tendem a ser mais decisivos. A McLaren ratificou, nos ensaios que presenciei, seu estado de arte nessas manobras. Não me surpreenderei se em alguma corrida assistir a uma parada na casa dos dois segundos.
Para resumir, é possível para mim afirmar, a partir dos elementos que emergiram nos testes, que Alonso é, sim, candidato ao título.
Felipe Massa
Quilômetros percorridos na pré-temporada: 2.336,4 (12.º)
Melhor tempo em Barcelona: 1min21s266, pneus supermacios, dia 02/03.
Vejo o mesmo Massa autoconfiante antes do turbilhão que o atropelou nos três últimos anos, desde que Alonso chegou à Ferrari. A melhor decisão que poderia ter tomado, juntamente com a família, foi ter procurado ajuda profissional. Um bom psicólogo o traria de volta a sua realidade. Como fez. Ainda que a história da competição demonstre que Alonso é mais completo que ele, a diferença entre ambos não é a de 2010, 2011 e da primeira metade do ano passado, mas a das dez etapas finais de 2012, quando esteve sempre próximo do espanhol, quando não na frente.
Como o F138 não nasceu deficiente como o F2012 e os novos pneus Pirelli permitem a Massa manter seu estilo de pilotagem, sem ter de se adaptar, como era o caso no ano passado, apostaria num bom campeonato de Massa. Vejo-o potencialmente até mesmo capaz de poder vencer um ou outro GP, caso o carro da Ferrari tenha, no calor, performace semelhante à que vimos em Barcelona, em especial depois de incorporar os últimos componentes, aerofólio dianteiro, laterais e difusor.
McLaren
Quilômetros percorridos na pré-temporada: 4.625,7 (4.ª)
A exemplo da Ferrari no ano passado, a organização inglesa por vezes se perde na compreensão do modelo MP4/28-Mercedes. A suspensão dianteira tipo pull rod e as soluções gerais do carro, ainda que não revolucionárias, são bem distintas das adotadas pela McLaren nos últimos anos. E sempre que há uma mudança conceitual no projeto não é de uma hora para outra que os técnicos dominam suas reações. Tudo isso com a importante variável dos pneus. Além de distintos dos usados no ano passado apresentaram aderência abaixo de como vão se comportar durante a temporada.
Estava sentado ao lado de Jenson Button na entrevista, em Barcelona, quando com sua maneira tranquila e sincera de falar nos disse: “Não sei o que esperar. Os pneus respondem com mais lógica que em 2012, além de ganharem temperatura mais rápido, mas nosso carro se comporta uma hora de determinada maneira e depois de outra. Precisamos entendê-lo, ainda”.
De qualquer forma, Tim Goss e Paddy Lowe coordenaram um grupo de técnicos capazes no projeto do monoposto. Lowe, você sabe, irá para a Mercedes. A McLaren vai crescer durante o ano. E a boa notícia é de que com os elementos disponíveis em Jerez e Barcelona dá para dizer, com boas razões, que o carro tem uma base eficiente e deve lutar pelas primeiras colocações.
Jenson Button
Quilômetros percorridos na pré-temporada: 2.087,6 (16.º)
Melhor tempo em Barcelona: 1min21s444 (5.º), pneus macios, dia 03/03.
Talvez não encontre a moleza que imaginava com Sergio Perez como companheiro. Mas lida bem isso se for o caso. Aceitar competir pela McLaren, com Lewis Hamilton no seu feudo, e vencê-lo, como fez em 2011, é para poucos. Button conseguiu. Está mais motivado que nunca com a posição de líder dentro da McLaren. Além de mais experiente, já ter sido campeão, e conhecer todos no time é inglês, o que numa escuderia inglesa por excelência faz diferença.
Não que, no caso da McLaren, receberá o que há de melhor, pois o grupo de Ron Dennis tem estrutura para fornecer dois equipamentos iguais, mas se em algum momento a equipe tem de decidir entre um e outro, e isso ocorre com frequência, tenha a certeza de que será sempre pró-Button.
A única maneira de fazer com que uma organização inglesa não aja dessa forma é se o outro piloto for excepcional, como foram Nelson Piquet, no seu tempo de Williams, e Ayrton Senna, na McLaren. Mas Perez é um estreante num time grande e é mexicano.
Como este ano as corridas exigirão melhor visão da competição, o piloto vai intervir mais na estratégia, em razão de os pneus Pirelli terem menor vida útil, o cenário está montado para Button expor o seu melhor: a inteligência. Acredito que ganhará mais de um GP.
Sergio Perez
Quilômetros percorridos na pré-temporada: 2.538,1 (5.º)
Melhor tempo em Barcelona: 1min21s848, pneus macios, dia 20/02
A condição de corrida é muita diferente da de um treino, onde há tempo para se decidir o que fazer. Mas senti no próprio Perez que o desafio de correr pela McLaren é, pelo que pôde entender até agora, menor do que fazia ideia. É bem verdade que as pressões nem começaram pois não houve disputa em jogo até agora. Mas Sergio está diferente. Conversa demonstrando maior consciência, pensa nas respostas, essencialmente se interessa pela conversa, o que não ocorria, e até nos olha quando fala.
Claramente está mais autoconfiante de no fim do ano passado. Depois de assinar com a McLaren perdeu-se emocionalmente. Na Sauber, não marcou um único ponto nas seis provas finais da temporada. Como Button, tem um estilo delicado de pilotagem, submete os pneus a menos esforços da maioria, sem deixar de ser veloz. Pelas características desta edição do Mundial, pode se dar bem em várias etapas, a começar pela Malásia, onde será um desafio reduzir o desgaste dos pneus por conta da natureza do traçado e o calor arrasador no Autódromo de Sepang.
Não pode perder a cabeça de novo, como em 2012, se os resultados não forem o que imagina pode obter com o carro da McLaren, muito superior ao que conheceu na Sauber nos seus dois primeiros anos de Fórmula 1. Vejo-o com chance de poder conquistar este ano sua primeira vitória na Fórmula 1.
Lotus
Quilômetros percorridos na pré-temporada: 3.426,9 (10.ª)
Estar à frente apenas da Williams em quilômetros acumulados nos treinos com os modelos de 2013 reflete com precisão com foi o nível de confiabilidade do projeto E21-Renault coordenado por Martin Tolliday: baixo. Raikkonen enfrentou problemas de transmissão vários dias. O carro permaneceu parado nos boxes horas.
Mas esse aspecto não tira o brilho da Lotus na pré-temporada. Desde o primeiro ensaio o monoposto mostrou-se rápido. E a simulação de corrida que Romain Grosjean realizou dia 21 no Circuito da Catalunha foi a melhor dentre todos os concorrentes. Além de não apresentar nenhuma pane o E21 mostrou-se rápido e constante. Lidou bem com o desgaste elevado dos pneus.
Vi a Lotus quase no estágio de Red Bull embora, como escrevi, as escuderias têm uma referência nas condições dos testes de inverno e depois, durante a temporada, a coisa é um pouco diferente. Lotus, Ferrari e, logo mais falaremos dela, Mercedes, parecem ter dado importante passo adiante em relação a 2012. Se essa evolução for comprovada no calor, prepare-se para assistir a dez pilotos em condições de vencer uma corrida, o que seria sensacional.
Kimi Raikkonen
Quilômetros percorridos na pré-temporada: 1.082,2 (21.º)
Melhor tempo em Barcelona: 1min21s658 (8.º), pneus macios, dia 03/03
Apenas cinco pilotos ficaram à frente de Raikkonen em permanência na pista nas três séries de testes: Jules Bianchi, por ter treinado com a Marussia apenas na última série, Luiz Razia (Marussia), James Rossiter (Force India), Pedro de la Rosa (Ferrari), e Davide Valsecchi (Lotus), ou seja, com exceção de Bianchi, nenhum irá disputar o campeonato.
“Não estou preocupado com isso (resistência do E21). O carro é melhor que o anterior em tudo. Vamos lutar mais na frente este ano”, afirma o finlandês. É mesmo o que os ensaios sugerem que irá acontecer. Quem é que gosta de Fórmula 1 e não está torcendo para já daqui a pouco mais de uma semana tudo se comprove?
“Melhoramos em uma volta lançada, algo que nos prejudicou em 2012. Isso também vai ajudar”, disse-me Raikkonen, na entrevista de Barcelona. Nessa conversa demonstrou sua personalidade outsider de novo. Perguntei a ele o que havia visto nos adversários enquanto os engenheiros e mecânicos da Lotus quebravam a cabeça para entender as seguidas falhas no sistema de transmissão: “Não sei, não vi, estava no motorhome assistindo à televisão”.
Indiferença total ao que faz a concorrência? Sim. Mas isso afeta a capacidade de produção de Raikkonen? Não. Como me disse Eric Boullier, chefe da Lotus, “deixe Kimi ser Kimi e você terá o melhor dele”. Se o time de Gerhard Lopez ratificar a velocidade e constância dos treinos de inverno e resolver a dificuldade com a resistência do E21, poderemos ver Raikkonen lutando pelo título com ainda mais poder de fogo que em 2012. Muito bom.
Romain Grosjean
Quilometragem percorrida na pré-temporada: 2.270,3 (13.º)
Melhor tempo em Barcelona: 1min22s188 (11.º), pneus macios, dia 21/02
O que mais me chamou a atenção nas conversas com Grosjean, mesmo agora no último teste em Barcelona, foi a forma como está dizendo aos jornalistas saber o que a equipe e a torcida esperam dele: não se envolver em acidentes na primeira volta. Tomara que haja coerência entre o discurso e a prática.
Fez boa pré-temporada, ao ser sempre rápido, simular com perfeição uma corrida e não cometer erros comprometedores. É muito veloz em uma volta lançada, mas não tem a capacidade de Raikkonen de receber a bandeirada na maioria das vezes bem colocado. Grosjean ainda é um piloto de bom desempenho seguido por outro desastroso. Este ano irá responder se essa é uma característica decorrente da falta de experiência, ainda, ou sua mesmo como piloto. Se vencer esta, até mesmo sua permanência na Fórmula 1 estará em xeque em 2014. Mas eu penso que Grosjean pode realizar trabalho melhor que no ano passado e se estabelecer na competição.
Mercedes
Quilômetros percorridos na pré-temporada: 5.224,1 (2.ª)
No primeiro dia em Jerez, 5 de fevereiro, terça-feira, Nico Rosberg completou 14 voltas com o modelo W04, apresentado no dia anterior lá mesmo. Na quarta-feira, dia seguinte, foi a vez de Lewis Hamilton estrear oficialmente no seu novo time. Deu 15 voltas, apenas. E muitos pensaram que a Mercedes teria momentos ainda mais difíceis pela frente, depois de se reestuturar completamente, ao incluir até novos sócios e diretoria executiva.
Não foi o que aconteceu. A partir daí seu rápido W04 só perdeu para o modelo C32-Ferrari da Sauber em quilômetros percorridos. E ao mesmo tempo em que demonstrou a confiabilidade que parecia não existir no início da preparação apresentou excelente velocidade. Uma informação importante: depois de Hamilton e Rosberg serem muito rápidos, posicionei-me na sala de imprensa próximo ao vidro que me permitia ver a reta dos boxes tendo um computador a minha frente. Queria acompanhar como seria a série seguida de voltas da escuderia alemã.
A variação é maior da que verifiquei na Red Bull, Ferrari e principalmente Lotus. Por isso, em condição de corrida, no circuito Albert Park, não sei o que esperar do modelo W04. Imagino que se ratificar seu dotes de velocidade no asfalto a 35 graus Celsius em vez de 15, a exemplo de Barcelona, deve permitir a seus pilotos lutarem pela pole position. Já quanto à vitória seria uma gostosa surpresa.
O projeto do W04 foi coordenado por Aldo Costa, ex-Ferrari, sob a supervisão geral de Bob Bell, ex-Renault, enquanto o grupo de engenheiros de Geoff Willis desenvolve o complexo monosto de 2014, com motor turbo e dois motores elétricos. Seria inocência supor que Paddy Lowe vai estar em casa aguardando o estabelecido no seu contrato com a McLaren, não trabalhar para outro time até o fim do ano, para então se dedicar à Mercedes. Não hesito em acreditar que mesmo distante da sede da escuderia, em Brackley, perto de Silverstone, Lowe vai colocar a mão no projeto do modelo de 2014, o que é ótimo para a Mercedes.
Nos próximos dias, talvez entre as provas da Austrália e Malásia, vou explicar em detalhes como será a nova era turbo da Fórmula 1. Em Jerez aprendi muita coisa a esse respeito. Mas tenho de avançar mais no meu conhecimento.
O desafio de engenharia para os grupos de trabalho, amigos, está sendo imenso. Não há como não acreditar que haverá quem vai interpretá-lo melhor e produzir um carro muito superior ao da concorrência. Depois deste ano, Fórmula 1 competitiva, como agora, apenas em 2015 e, ainda assim, com reservas, diante da complexidade do que vem por aí.
De volta a 2013. Dá para acreditar que dentre McLaren, Ferrari e Lotus a Mercedes foi a equipe que maior passo deu de 2012 para cá, seguida da Lotus e da Ferrari. E piloto não falta à organização alemã. Rosberg é bom e Hamilton, excepcional.
Lewis Hamilton
Quilômetros percorridos na pré-temporada: 2.584,3 (3.º)
Melhor tempo em Barcelona: 1min20s558 (3.º), pneus macios, dia 02/03.
Suas entrevistas foram as mais tumultuadas no Circuito da Catalunha. Não havia distinção entre jornalistas de TV, rádio e imprensa escrita. Com um sério agravante: o elevado número de fãs solicitando autógrafo e tirar foto ao seu lado, ao mesmo tempo. Impressionante o amadorismo da organização. Mais: dois seguranças não distinguiam quem dispõe da credencial permanente da FIA e a certa altura impediam de entrar na área coberta por tenda da Mercedes. Os fãs estavam lá dentro, vários jornalistas, não.
Nada contra a torcida, por favor, mas tem hora e lugar para pedir autógrafo, não durante o trabalho profissional. Dia 2 consegui ainda me posicionar de forma a ouvi-lo e até lhe fiz pergunta, mas dois dias antes sequer foi possível chegar perto, o que fez com que pedisse à assessora de imprensa da Mercedes, Nicola Armstrong, o arquivo digitalizado da conversa com a imprensa.
Gosto de estar lá, ver as reações dos pilotos às questões propostas, fazer perguntas, tudo isso nos permite entender melhor seu estado de espírito, sua perspectiva, enfim, nos é bem mais revelador que simplesmente ouvir uma entrevista.
Hamilton já começou a mostrar o quanto poderá útil à equipe. O estado de espírito do grupo é outro, disse-me Niki Lauda, informalmente. Isso tudo decorre do fato de o W04 ter nascido “bom” na avaliação de Lauda e os integrantes do grupo saberem que no fim da linha, quando entregam o carro a um piloto, podem esperar que vem coisa boa, ele irá explorá-lo além dos seus limites. “Não existe estímulo melhor na Fórmula 1”, comentou Lauda, sem se referir especificamente a Hamilton. “Todos se sentem pressionados por si próprios a fazer o mesmo.”
Perguntei ao fantástico piloto inglês se estava surpreso com o início do trabalho na Mercedes: Mais fácil do que esperava? Hamilton pensou um tempo e respondeu: “Mais fácil não, mas diferente”. Senti o dedo da assessoria orientando-o, previamente, sobre a questão. Se respondesse que sim, como imagino que por si diria, seria uma forma de reconhecer que o time da Mercedes estava mesmo muito em baixa no fim do campeonato de 2012.
O discurso de Hamilton, sábado, foi outro. Afirmou que pode ganhar um GP este ano. Antes sequer admitia a possibilidade. É o resultado de ter completado o equivalente a 8,5 Gps em quilometragem nos testes e compreendido que o W04 pode lhe permitir um ano melhor do suposto antes de sentar no cockpit, tendo em conta o histórico da Mercedes desde a volta à Fórmula 1, em 2010.
Não sei como será em Melbourne e menos ainda na Malásia, com aquele calor todo. Mas na curva 9 de Barcelona vi o W04 superá-la com surpreendente desenvoltura. E ali exige-se boa geração de pressão aerodinâmica. Como escrevi antes, Hamilton e Rosberg perdem mais tempo no volta a volta seguido que Vettel, Grosjean e Alonso, por exemplo, mas em uma volta lançada impressiona.
Não creio que Hamilton e Rosberg estivessem com gasolina apenas para aquela volta rápida, na simulação de classificação. Pode até ser o caso, mas não os levaria a nada. Ao contrário, criaria a mesma expectativa do ano passado, quando da mesma forma realizaram bela pré-temporada e depois não corresponderam ao que esperava. Seria repetir um equívoco. E tudo o que a Mercedes não precisa, agora, é ter ainda mais pressão da já existente.
Hamilton deverá andar mais à frente do que imaginava, desde o começo da temporada. Quanto à frente precisamos esperar as desafiadoras 56 voltas no circuito de Sepang, na Malásia, sob temperatura sempre superior a 30 graus Celsius.
Nico Rosberg
Quilometragem percorrida na pré-temporada: 2.639,8 (2.º)
Melhor tempo em Barcelona: 1min20s130 (1.º), pneus macios, dia 03/03.
O ser humano produz por estímulo ou castigo. Pois pode acreditar que Rosberg está mais que estimulado. Compartilhar a Mercedes com Hamilton está exigindo elevado estado de vigília, dedicação, estudos e investimento em trabalho.
Um profissional da organização, há muito conhecido, disse-me vê-lo bem distinto: “Nico aprendeu muito com Michael (Schumacher) a prestar atenção em todos os detalhes. Tudo interfere no resultado final. Nos dizia entender por que Michael ganhou sete títulos. Mas agora o vejo se aprofundar mais ainda em todas as questões, deseja saber o que se passa, o que estamos fazendo”.
Infelizmente o ambiente da Fórmula 1 se tornou doente e pessoas com quem você fala há mais de 15 anos de repente são proibidas de, oficialmente, conversar com você, por conta dessa política insana de nada poder sair da organização sem antes um assessor de imprensa avaliar se pode se dito. Perderam a noção do quão doentes estão. Virou uma obsessão. Isso me obriga a conversar com esses profissionais e simplesmente não escrever seus nomes para não comprometê-los. É ridículo, amigos.
Uma ocasião a assessora da então Honda, hoje na Marussia, Trace Novak, me viu aguardando Rubens Barrichello e Gil de Ferran e veio até onde eu estava para dizer que eles não iriam falar comigo, sem sequer saber se eu estava lá com intenções profissionais. Não tenho histórico de ser rude, pois nesse dia perdi a paciência. É o caso, agora, com técnicos que me esclarecem dúvidas ou mesmo me contam coisas, por saberem com vou tratar o assunto com profissionalismo. Muitas vezes, infelizmente, guardo para o meu conhecimento, apenas.
Rosberg deve disputar talvez, pelo que pudemos compreender, sua melhor temporada na Fórmula 1. Há razões para acreditarmos nisso. Mas no confronto com Hamilton eu me surpreenderia muito se vencesse. Não acredito.
Se alguém veio até o fim nesse texto parabéns. É um herói. Vamos ficar por aqui senão não terei um único leitor. Antes de embarcar para Melbourne, segunda-feira, ou durante a longa viagem até lá, espero poder colocar no ar outro post bem, mas bem menor, com a análise das seis escuderias restantes.
Abraços, amigos!
Olá amigos, coloco no ar o post sobre o último teste de Barcelona apenas agora, quinta-feira de manhã, e não ontem, conforme combinamos, porque precisei me estender um pouco mais na preparação para a longa viagem a Austrália, Malásia, China e Bahrein, as quatro primeiras etapas do campeonato.
Antes de falarmos propriamente do último ensaio no Circuito da Catalunha, gostaria de fazer alguma considerações sobre a pré-temporada em si. Senhores, tenha a certeza de que na sexta-feira, dia 15, lá no circuito Albert Park, em Melbourne, todos os carros vão estar na pista o máximo de tempo possível. Não vai ter essa de ficar parado economizando pneus. Não creio, ao menos.
A razão é simples: será provavelmente a primeira vez que as equipes vão poder conhecer como seus carros se comportam sob temperaturas compatíveis com as que enfrentarão durante o campeonato. Nos treinos de inverno houve um único dia, o último, em que o asfalto se aproximou dos 20 graus, ainda assim abaixo dos mais de 30 usuais ao longo do calendário.
Os pneus Pirelli são compostos por uma porcentagem de borracha natural e outra sintética, química. A indústria de pneus funciona assim. E para ativar algumas das substâncias que os compõem é necessário atingir determinada temperatura. Por isso a Pirelli informa os times qual a faixa de temperatura para o uso. Abaixo disso, como foi em todos os testes, essas substâncias não são ativadas e, claro, o grau de aderência é bem menor.
Sendo menor, o carro escorrega mais, provocando rápido e elevado desgaste da banda de rodagem. Vimos no paddock de Jerez de la Frontera e Barcelona os pneus sendo lavados, depois de saírem dos carros, e era impressionante. Agora no circuito Albert Park, com o asfalto próximo dos 30 graus, caso não chova, os pilotos e seus engenheiros vão compreender com esses novos pneus funcionam de verdade.
Quer saber? Ouvi de muita gente no paddock que deveremos ter belas surpresas na primeira etapa do Mundial, como de Ross Brawn, da Mercedes, e Pat Fry, Ferrari. Não que a imagem da Fórmula 1 exposta na pré-temporada não tenha servido para nada e, de repente, alguém que está lá atrás passe a competir entre os primeiros, mas podemos, sim, assistir a uma disputa um pouco distinta da sugerida pelos testes.
Por exemplo: a Mercedes andou muito bem em Barcelona. Hamilton e Rosberg estabeleceram o primeiro e o terceiro tempo, em absoluto, além de a escuderia ficar atrás apenas da Sauber em quilômetros percorridos. Mas eu me lembro do ensaio do ano passado e, da mesma forma, sob temperatura mais baixa, a Mercedes andou muito bem. E mesmo na etapa de Melbourne, no meio da pista, o carro me impressionou.
Cheguei a escrever, depois de assistir às sessões livres no S de alta, que estava faltando piloto para a organização alemã. O modelo W03 na mão de Vettel, Hamilton ou Alonso seria um potencial vencedor da corrida. Mas depois a Mercedes se perdeu no seu desenvolvimento. Andou bem, apenas, no GP da China, quando enfrentamos um frio inesperado.
Torço para não ser o caso, agora, e Hamilton e Rosberg se insiram mesmo dentre os candidatos regulares à vitória. Seria ótimo para a Fórmula 1. Em resumo, amigos, o que desejo dizer é que a ordem de forças anunciada pelos cerca de 5 mil quilômetros acumulados pelas equipes pode se mostrar um pouco distinta. O que é ótimo. O interesse pelo GP da Austrália já é ainda maior do normal.
A seguir, vamos passear pelo trabalho de cada equipe e piloto ao longo do mês de preparação para o campeonato. Os dados estatísticos eu mesmo os apurei, a partir dos números distribuídos nas salas de imprensa dos autódromos de Jerez e Barcelona, refiro-me à ordem dos tempos e número de voltas em cada traçado. A saber, Jerez com 4.428 metros e Barcelona, 4.655 metros.
Red Bull
Quilômetros percorridos nos três testes: 4.607,4 (5.ª melhor)
Se a ordem era esconder o jogo, foi cumprida com perfeição teutônica. No último teste, os mecânicos ensaiaram uma coreografia para recepcionar o carro que se aproximava dos boxes. Com movimentos sincronizados, o cercavam com os painéis móveis, rapidamente, para ninguém ter tempo de observá-lo ou, pior, registrar fotografias.
Vi Vettel e Webber não comandarem o DRS, o flap móvel, na reta dos boxes em Barcelona, a fim de não ganharem os cerca de 3/10 que o recurso oferece, por se tratar de uma reta de 1.097 metros. Como escrevi da outra vez, da sala de imprensa temos uma visão superior dos carros por a parede que a separa da pista ser de vidro e construída bastante inclinada. Pode-se ver o que está abaixo.
Não tenho metade dos olhos de lince de Giorgio Piola para ver e entender o que mudou em relação ao que existia nos carros. Desculpe, metade é muita pretensão; 20%, se tanto. Mas Adrian Newey, na última versão do conjunto traseiro do RB9-Renault, criou laterais que conduzem o ar e os gases do escape com eficiência ainda maior para o difusor, a curvatura na parte final do assoalho.
O difusor, por sinal, era também novo. Os técnicos o pintaram com a característica tinta verde, concebida para identificar o direcionamento dos fluxos de ar que se deslocam pela superfície. Toda a encenação para esconder o segredo relaciona-se, provavelmente, com alguma solução que Newey introduziu no conjunto aerodinâmico traseiro.
Curiosamente, vi Vettel ficar um pouco para trás quando estava na pista ao mesmo tempo que Alonso com a Ferrari F138, domingo, instante em que usavam os pneus duros em um long run. Não estou dizendo, por favor, que a Red Bull está atrás da Ferrari. Penso o contrário. E há muitos fatores que podem explicar Vettel estar mais lento naquele momento, como estado dos seus pneus, volume de combustível no tanque ou mesmo estratégia.
Para quem analisa os tempos nas séries de 12 a 15 voltas, com pneus médio e macios da Pirelli, a Red Bull sugere estar melhor não só que a Ferrari mas todos os demais. A longa e veloz curva 3 de Barcelona é bastante reveladora da maior eficiência aerodinâmica do seu monoposto, RB9-Renault, lindo, por sinal.
Por conta de a Infiniti ter estabelecido com a Red Bull um acordo de parceria técnica e patrocínio em bases bem mais amplas dos anos anteriores, o azul escuro do time austríaco ficou um pouco diferente, menos escuro e mais para o roxo. É uma cor que os italianos têm medo. A associam à morte.
Mas a Red Bull está bem viva e seria uma surpresa para todos se não lutasse pela pole position e a vitória na abertura do Mundial. Não vejo, contudo, uma vantagem técnica significativa no modelo RB9 em relação aos concorrentes. Vettel nos disse não saber como interpretar o comportamento do RB9 domingo, em Barcelona, em razão de os pneus estarem tão fora das especificações para os quais foram projetados.
Análise de um integrante de outra escuderia, mas de relação muito próxima a da Red Bull: “Você opta por um acerto e vai para a pista. As reações são opostas às esperadas. Acontece. Muda a partir dos dados que obtém, regressa à pista acreditando que aquilo vai melhorar o carro e, de novo, o resultado é distinto. A única explicação que encontramos para essa falta de lógica é o mau funcionamento dos pneus por causa da temperatura baixa”.
Foi isso o que Vettel comentou, embora com menos detalhes, no Circuito da Catalunha, domingo. Esse quadro mostra que até mesmo a organização de melhor conjunto na pré-temporada vai para Melbourne com dúvidas profundas, como os demais.
Sebastian Vettel
Quilômetros percorridos na pré-temporada: 2.342,9 (11.º)
Melhor tempo em Barcelona: 1min22s197, pneus macios (12.º), dia 20/02.
Sem nenhum demérito para Mark Webber, que é um bom piloto. Mas uma coisa é você estar na pista para ver de perto o comportamento dos carros e observar um e outro piloto na condução do RB9. O alemão freia mais dentro, leva mais velocidade para dentro da curva, permanece menos tempo com o pé fora do acelerador.
Com o tempo você se educa a detectar essas diferenças pequenas entre as pilotagens. Compreende-se rapidamente o nível superior de condução de Vettel, uma arte. Dedicado e detalhista, como sempre, começa o ano, para mim, como o piloto com mais chances de surgir na fase final do campeonato em condições de lutar pelo título, o quarto seguido na brilhante carreira.
Mark Webber
Quilômetros percorridos na pré-temporada: 2.264,5 (14.º)
Melhor tempo em Barcelona: 1min22s658 (16.º), pneus macios, dia 02/03.
Sabe que somente uma temporada irretocável o manterá na Red Bull em 2014. O australiano conversa com você nas entrevistas como se batesse um papo, foge o padrão formal da Fórmula 1. Se você o parar no paddock e lhe fizer uma pergunta não te deixa sem resposta. Webber gostou do comportamento do RB9 embora, como todos, deixasse em aberto uma opinião final sobre o carro. “Claramente é melhor que o de 2012. Quanto ainda não dá para saber. Vamos esperar até a China.” Seria surpreendente vê-lo disputar o campeonato, ainda que me deixasse contente.
Ferrari
Quilômetros percorridos na pré-temporada: 4.912,9 (3.ª)
Fernando Alonso não poderia ter sido mais explícito na sua análise: “No GP do Brasil do ano passado (última etapa) estávamos a 7 ou 8 décimos de segundo atrás da Red Bull e da McLaren, os melhores. Nosso objetivo este ano era reduzir essa diferença para 2 ou 3 décimos. Depois dos testes posso responder que atingimos nosso objetivo”. Portanto, a Ferrari avançou e, segundo o melhor piloto em atividade, mais que os concorrentes.
A Ferrari talvez tenha sido o time que mais melhorou o monoposto do primeiro ensaio em Jerez para o último. Em Barcelona, sábado, Felipe Massa deixou os boxes com um novo e sofisticado aerofólio dianteiro, difusor e novas laterais. É impressionate o número de flaps que estamos vendo este ano no aerofólio dianteiro. Flap é aquele perfil de asa instalado depois do perfil alar principal.
A porção final, onde se encontra o terminal de escape, ficou bem mais baixa. Mas a forma de gerar pressão é distinta da solução da Red Bull e, este ano, Lotus, onde os terminais exalam os gases tangenciando a carenagem, direcionando-os diretamente para o difusor. A escola da Ferrari é a da McLaren. Os gases são expelidos mais para a lateral. E quem faz o trabalho maior de direcioná-los para o difusor é o ar em alta velocidade que flui por ali. As duas soluções parecem funcionar bem. Tudo depende de como o projeto, em geral, é concebido.
O fato é que a Ferrari não deverá sofrer para chegar no Q3 nas primeiras etapas, como em 2012. E na simulação de corrida Massa fez séries de voltas com os pneus médios bastante respeitáveis para a condição do treino. Não apresentou, porém, o mesmo desempenho da Lotus de Grosjean no mesmo exercício. Se tivesse de apostar, tendo comigo tudo o que vi, diria que Alonso e Massa devem dispor de um carro para lutar pelo pódio no início da temporada. “Na China vamos ter um grande pacote novo”, explicou Pat Fry, em Barcelona.
Fernando Alonso
Quilômetros percorridos na pré-temporada: 2.3560,7 (10.º)
Melhor tempo em Barcelona: 1min20s494 (2.º), pneus macios, dia 03/03.
Sua determinação impressiona. No futebol corresponderia àquele jogador que toca sempre a bola no sentido do gol e não para as laterais. Adotou, contudo, um discurso perigoso, lançando sobre si responsabilidade ainda maior da que possui, ao afirmar aos quatro cantos que vai lutar pelo título. “Se em 2012 começamos o ano com um carro que era de 1,5 a 2 segundos mais lentos e na etapa final tínhamos chances de vencermos o campeonato, agora, partindo de uma base 200 vezes melhor, nossas possibilidades são ainda maiores”, afirmou o asturiano.
Depois do primeiro teste em Barcelona, de 19 a 22 de fevereiro, o primeiro de Alonso por não ter participado do ensaio de Jerez, deixou o circuito com cara de quem esperava mais do F138. Conheço profissionalmente Alonso desde quando corria na Fórmula 3000, em 2000, e tinha apenas 19 anos de idade. Dá para saber quando está satisfeito ou louco da vida, apesar de procurar não transparecer.
Mas o Alonso que vimos domingo e a Ferrari gentilmente não permitiu falar com a imprensa era outro. Aliás, uma parágrafo. Há patrocinadores que perderam a noção de limite. E escuderias que, por conta dessa relação com o investidor, da mesma forma perderam a noção do que é o mundo profissional, do que deve ser respeitada a relação com a imprensa. Refiro-me ao Banco Santander e à Ferrari.
Massa e Alonso não poderiam conversar conosco, depois do último teste antes do embarque para a Austrália, porque estavam escalados para o evento promocional programado pelo banco para a segunda-feira, um dia depois de encerrada a pré-temporada, também no Circuito da Catalunha. Em outras palavras, quem desejasse ouvir os pilotos deveria, necessariamente, prestigiar a ação do banco no autódromo.
Não vou entrar no mérito de que tudo deve ter sido bem organizado e seria uma bela oportunidade de andar ao lado de Alonso e Massa, com o modelo Ferrari 458 Italia, no traçado catalão. Não é essa a questão, mas por qual razão nos dias dos testes não disponibilizaram os pilotos para os jornalistas? Por que motivo temos compulsoriamente de estar presente num evento promocional para fazer perguntas aos pilotos? Mais: pagar uma diária a mais de hotel e no aluguel do carro.
Se os jornalistas fossem unidos, ninguém deveria ir a ação do banco. E que se divertissem entre eles. Claro que para o Santander é absolutamente irrelevante estarmos ou não no evento, sequer sabem da nossa existência, mas ao menos com a minha consciência fiquei em paz ao embarcar na segunda-feira de manhã para casa, em Nice, de onde escrevo agora.
Se tivessem escalado Alonso e Massa para falar conosco sábado e domingo, depois do seus últimos treinos, e nos lembrassem depois da programação do evento de segunda-feira teria sido profissional, simpático e convidativo. Seria o esperado de empresas da dimensão de um banco como o Santander e uma fabricante de carros do nível da Ferrari. Mas nada disso aconteceu.
Voltando. Em vez de um parágrafo, como escrevi, redigi cinco. Alonso tinha outra expressão depois de completar 120 voltas, o equivalente a quase dois Gps, domingo. Simulou uma classificação e registrou bela marca, a segunda do teste, ainda que não tivesse com o tanque com tão pouca gasolina, segundo ouvi no paddock. Alonso dedicou-se, ainda, na hora final, a operações de pit stop. Dava uma ou duas voltas e reentrava nos boxes, bem abaixo da sala de imprensa, o que nos permitiu ter uma visão espetacular de toda movimentação.
Senhores, os times estão superpreparados para enfrentar uma temporada com mais pit stops do ano passado. Eles tendem a ser mais decisivos. A McLaren ratificou, nos ensaios que presenciei, seu estado de arte nessas manobras. Não me surpreenderei se em alguma corrida assistir a uma parada na casa dos dois segundos.
Para resumir, é possível para mim afirmar, a partir dos elementos que emergiram nos testes, que Alonso é, sim, candidato ao título.
Felipe Massa
Quilômetros percorridos na pré-temporada: 2.336,4 (12.º)
Melhor tempo em Barcelona: 1min21s266, pneus supermacios, dia 02/03.
Vejo o mesmo Massa autoconfiante antes do turbilhão que o atropelou nos três últimos anos, desde que Alonso chegou à Ferrari. A melhor decisão que poderia ter tomado, juntamente com a família, foi ter procurado ajuda profissional. Um bom psicólogo o traria de volta a sua realidade. Como fez. Ainda que a história da competição demonstre que Alonso é mais completo que ele, a diferença entre ambos não é a de 2010, 2011 e da primeira metade do ano passado, mas a das dez etapas finais de 2012, quando esteve sempre próximo do espanhol, quando não na frente.
Como o F138 não nasceu deficiente como o F2012 e os novos pneus Pirelli permitem a Massa manter seu estilo de pilotagem, sem ter de se adaptar, como era o caso no ano passado, apostaria num bom campeonato de Massa. Vejo-o potencialmente até mesmo capaz de poder vencer um ou outro GP, caso o carro da Ferrari tenha, no calor, performace semelhante à que vimos em Barcelona, em especial depois de incorporar os últimos componentes, aerofólio dianteiro, laterais e difusor.
McLaren
Quilômetros percorridos na pré-temporada: 4.625,7 (4.ª)
A exemplo da Ferrari no ano passado, a organização inglesa por vezes se perde na compreensão do modelo MP4/28-Mercedes. A suspensão dianteira tipo pull rod e as soluções gerais do carro, ainda que não revolucionárias, são bem distintas das adotadas pela McLaren nos últimos anos. E sempre que há uma mudança conceitual no projeto não é de uma hora para outra que os técnicos dominam suas reações. Tudo isso com a importante variável dos pneus. Além de distintos dos usados no ano passado apresentaram aderência abaixo de como vão se comportar durante a temporada.
Estava sentado ao lado de Jenson Button na entrevista, em Barcelona, quando com sua maneira tranquila e sincera de falar nos disse: “Não sei o que esperar. Os pneus respondem com mais lógica que em 2012, além de ganharem temperatura mais rápido, mas nosso carro se comporta uma hora de determinada maneira e depois de outra. Precisamos entendê-lo, ainda”.
De qualquer forma, Tim Goss e Paddy Lowe coordenaram um grupo de técnicos capazes no projeto do monoposto. Lowe, você sabe, irá para a Mercedes. A McLaren vai crescer durante o ano. E a boa notícia é de que com os elementos disponíveis em Jerez e Barcelona dá para dizer, com boas razões, que o carro tem uma base eficiente e deve lutar pelas primeiras colocações.
Jenson Button
Quilômetros percorridos na pré-temporada: 2.087,6 (16.º)
Melhor tempo em Barcelona: 1min21s444 (5.º), pneus macios, dia 03/03.
Talvez não encontre a moleza que imaginava com Sergio Perez como companheiro. Mas lida bem isso se for o caso. Aceitar competir pela McLaren, com Lewis Hamilton no seu feudo, e vencê-lo, como fez em 2011, é para poucos. Button conseguiu. Está mais motivado que nunca com a posição de líder dentro da McLaren. Além de mais experiente, já ter sido campeão, e conhecer todos no time é inglês, o que numa escuderia inglesa por excelência faz diferença.
Não que, no caso da McLaren, receberá o que há de melhor, pois o grupo de Ron Dennis tem estrutura para fornecer dois equipamentos iguais, mas se em algum momento a equipe tem de decidir entre um e outro, e isso ocorre com frequência, tenha a certeza de que será sempre pró-Button.
A única maneira de fazer com que uma organização inglesa não aja dessa forma é se o outro piloto for excepcional, como foram Nelson Piquet, no seu tempo de Williams, e Ayrton Senna, na McLaren. Mas Perez é um estreante num time grande e é mexicano.
Como este ano as corridas exigirão melhor visão da competição, o piloto vai intervir mais na estratégia, em razão de os pneus Pirelli terem menor vida útil, o cenário está montado para Button expor o seu melhor: a inteligência. Acredito que ganhará mais de um GP.
Sergio Perez
Quilômetros percorridos na pré-temporada: 2.538,1 (5.º)
Melhor tempo em Barcelona: 1min21s848, pneus macios, dia 20/02
A condição de corrida é muita diferente da de um treino, onde há tempo para se decidir o que fazer. Mas senti no próprio Perez que o desafio de correr pela McLaren é, pelo que pôde entender até agora, menor do que fazia ideia. É bem verdade que as pressões nem começaram pois não houve disputa em jogo até agora. Mas Sergio está diferente. Conversa demonstrando maior consciência, pensa nas respostas, essencialmente se interessa pela conversa, o que não ocorria, e até nos olha quando fala.
Claramente está mais autoconfiante de no fim do ano passado. Depois de assinar com a McLaren perdeu-se emocionalmente. Na Sauber, não marcou um único ponto nas seis provas finais da temporada. Como Button, tem um estilo delicado de pilotagem, submete os pneus a menos esforços da maioria, sem deixar de ser veloz. Pelas características desta edição do Mundial, pode se dar bem em várias etapas, a começar pela Malásia, onde será um desafio reduzir o desgaste dos pneus por conta da natureza do traçado e o calor arrasador no Autódromo de Sepang.
Não pode perder a cabeça de novo, como em 2012, se os resultados não forem o que imagina pode obter com o carro da McLaren, muito superior ao que conheceu na Sauber nos seus dois primeiros anos de Fórmula 1. Vejo-o com chance de poder conquistar este ano sua primeira vitória na Fórmula 1.
Lotus
Quilômetros percorridos na pré-temporada: 3.426,9 (10.ª)
Estar à frente apenas da Williams em quilômetros acumulados nos treinos com os modelos de 2013 reflete com precisão com foi o nível de confiabilidade do projeto E21-Renault coordenado por Martin Tolliday: baixo. Raikkonen enfrentou problemas de transmissão vários dias. O carro permaneceu parado nos boxes horas.
Mas esse aspecto não tira o brilho da Lotus na pré-temporada. Desde o primeiro ensaio o monoposto mostrou-se rápido. E a simulação de corrida que Romain Grosjean realizou dia 21 no Circuito da Catalunha foi a melhor dentre todos os concorrentes. Além de não apresentar nenhuma pane o E21 mostrou-se rápido e constante. Lidou bem com o desgaste elevado dos pneus.
Vi a Lotus quase no estágio de Red Bull embora, como escrevi, as escuderias têm uma referência nas condições dos testes de inverno e depois, durante a temporada, a coisa é um pouco diferente. Lotus, Ferrari e, logo mais falaremos dela, Mercedes, parecem ter dado importante passo adiante em relação a 2012. Se essa evolução for comprovada no calor, prepare-se para assistir a dez pilotos em condições de vencer uma corrida, o que seria sensacional.
Kimi Raikkonen
Quilômetros percorridos na pré-temporada: 1.082,2 (21.º)
Melhor tempo em Barcelona: 1min21s658 (8.º), pneus macios, dia 03/03
Apenas cinco pilotos ficaram à frente de Raikkonen em permanência na pista nas três séries de testes: Jules Bianchi, por ter treinado com a Marussia apenas na última série, Luiz Razia (Marussia), James Rossiter (Force India), Pedro de la Rosa (Ferrari), e Davide Valsecchi (Lotus), ou seja, com exceção de Bianchi, nenhum irá disputar o campeonato.
“Não estou preocupado com isso (resistência do E21). O carro é melhor que o anterior em tudo. Vamos lutar mais na frente este ano”, afirma o finlandês. É mesmo o que os ensaios sugerem que irá acontecer. Quem é que gosta de Fórmula 1 e não está torcendo para já daqui a pouco mais de uma semana tudo se comprove?
“Melhoramos em uma volta lançada, algo que nos prejudicou em 2012. Isso também vai ajudar”, disse-me Raikkonen, na entrevista de Barcelona. Nessa conversa demonstrou sua personalidade outsider de novo. Perguntei a ele o que havia visto nos adversários enquanto os engenheiros e mecânicos da Lotus quebravam a cabeça para entender as seguidas falhas no sistema de transmissão: “Não sei, não vi, estava no motorhome assistindo à televisão”.
Indiferença total ao que faz a concorrência? Sim. Mas isso afeta a capacidade de produção de Raikkonen? Não. Como me disse Eric Boullier, chefe da Lotus, “deixe Kimi ser Kimi e você terá o melhor dele”. Se o time de Gerhard Lopez ratificar a velocidade e constância dos treinos de inverno e resolver a dificuldade com a resistência do E21, poderemos ver Raikkonen lutando pelo título com ainda mais poder de fogo que em 2012. Muito bom.
Romain Grosjean
Quilometragem percorrida na pré-temporada: 2.270,3 (13.º)
Melhor tempo em Barcelona: 1min22s188 (11.º), pneus macios, dia 21/02
O que mais me chamou a atenção nas conversas com Grosjean, mesmo agora no último teste em Barcelona, foi a forma como está dizendo aos jornalistas saber o que a equipe e a torcida esperam dele: não se envolver em acidentes na primeira volta. Tomara que haja coerência entre o discurso e a prática.
Fez boa pré-temporada, ao ser sempre rápido, simular com perfeição uma corrida e não cometer erros comprometedores. É muito veloz em uma volta lançada, mas não tem a capacidade de Raikkonen de receber a bandeirada na maioria das vezes bem colocado. Grosjean ainda é um piloto de bom desempenho seguido por outro desastroso. Este ano irá responder se essa é uma característica decorrente da falta de experiência, ainda, ou sua mesmo como piloto. Se vencer esta, até mesmo sua permanência na Fórmula 1 estará em xeque em 2014. Mas eu penso que Grosjean pode realizar trabalho melhor que no ano passado e se estabelecer na competição.
Mercedes
Quilômetros percorridos na pré-temporada: 5.224,1 (2.ª)
No primeiro dia em Jerez, 5 de fevereiro, terça-feira, Nico Rosberg completou 14 voltas com o modelo W04, apresentado no dia anterior lá mesmo. Na quarta-feira, dia seguinte, foi a vez de Lewis Hamilton estrear oficialmente no seu novo time. Deu 15 voltas, apenas. E muitos pensaram que a Mercedes teria momentos ainda mais difíceis pela frente, depois de se reestuturar completamente, ao incluir até novos sócios e diretoria executiva.
Não foi o que aconteceu. A partir daí seu rápido W04 só perdeu para o modelo C32-Ferrari da Sauber em quilômetros percorridos. E ao mesmo tempo em que demonstrou a confiabilidade que parecia não existir no início da preparação apresentou excelente velocidade. Uma informação importante: depois de Hamilton e Rosberg serem muito rápidos, posicionei-me na sala de imprensa próximo ao vidro que me permitia ver a reta dos boxes tendo um computador a minha frente. Queria acompanhar como seria a série seguida de voltas da escuderia alemã.
A variação é maior da que verifiquei na Red Bull, Ferrari e principalmente Lotus. Por isso, em condição de corrida, no circuito Albert Park, não sei o que esperar do modelo W04. Imagino que se ratificar seu dotes de velocidade no asfalto a 35 graus Celsius em vez de 15, a exemplo de Barcelona, deve permitir a seus pilotos lutarem pela pole position. Já quanto à vitória seria uma gostosa surpresa.
O projeto do W04 foi coordenado por Aldo Costa, ex-Ferrari, sob a supervisão geral de Bob Bell, ex-Renault, enquanto o grupo de engenheiros de Geoff Willis desenvolve o complexo monosto de 2014, com motor turbo e dois motores elétricos. Seria inocência supor que Paddy Lowe vai estar em casa aguardando o estabelecido no seu contrato com a McLaren, não trabalhar para outro time até o fim do ano, para então se dedicar à Mercedes. Não hesito em acreditar que mesmo distante da sede da escuderia, em Brackley, perto de Silverstone, Lowe vai colocar a mão no projeto do modelo de 2014, o que é ótimo para a Mercedes.
Nos próximos dias, talvez entre as provas da Austrália e Malásia, vou explicar em detalhes como será a nova era turbo da Fórmula 1. Em Jerez aprendi muita coisa a esse respeito. Mas tenho de avançar mais no meu conhecimento.
O desafio de engenharia para os grupos de trabalho, amigos, está sendo imenso. Não há como não acreditar que haverá quem vai interpretá-lo melhor e produzir um carro muito superior ao da concorrência. Depois deste ano, Fórmula 1 competitiva, como agora, apenas em 2015 e, ainda assim, com reservas, diante da complexidade do que vem por aí.
De volta a 2013. Dá para acreditar que dentre McLaren, Ferrari e Lotus a Mercedes foi a equipe que maior passo deu de 2012 para cá, seguida da Lotus e da Ferrari. E piloto não falta à organização alemã. Rosberg é bom e Hamilton, excepcional.
Lewis Hamilton
Quilômetros percorridos na pré-temporada: 2.584,3 (3.º)
Melhor tempo em Barcelona: 1min20s558 (3.º), pneus macios, dia 02/03.
Suas entrevistas foram as mais tumultuadas no Circuito da Catalunha. Não havia distinção entre jornalistas de TV, rádio e imprensa escrita. Com um sério agravante: o elevado número de fãs solicitando autógrafo e tirar foto ao seu lado, ao mesmo tempo. Impressionante o amadorismo da organização. Mais: dois seguranças não distinguiam quem dispõe da credencial permanente da FIA e a certa altura impediam de entrar na área coberta por tenda da Mercedes. Os fãs estavam lá dentro, vários jornalistas, não.
Nada contra a torcida, por favor, mas tem hora e lugar para pedir autógrafo, não durante o trabalho profissional. Dia 2 consegui ainda me posicionar de forma a ouvi-lo e até lhe fiz pergunta, mas dois dias antes sequer foi possível chegar perto, o que fez com que pedisse à assessora de imprensa da Mercedes, Nicola Armstrong, o arquivo digitalizado da conversa com a imprensa.
Gosto de estar lá, ver as reações dos pilotos às questões propostas, fazer perguntas, tudo isso nos permite entender melhor seu estado de espírito, sua perspectiva, enfim, nos é bem mais revelador que simplesmente ouvir uma entrevista.
Hamilton já começou a mostrar o quanto poderá útil à equipe. O estado de espírito do grupo é outro, disse-me Niki Lauda, informalmente. Isso tudo decorre do fato de o W04 ter nascido “bom” na avaliação de Lauda e os integrantes do grupo saberem que no fim da linha, quando entregam o carro a um piloto, podem esperar que vem coisa boa, ele irá explorá-lo além dos seus limites. “Não existe estímulo melhor na Fórmula 1”, comentou Lauda, sem se referir especificamente a Hamilton. “Todos se sentem pressionados por si próprios a fazer o mesmo.”
Perguntei ao fantástico piloto inglês se estava surpreso com o início do trabalho na Mercedes: Mais fácil do que esperava? Hamilton pensou um tempo e respondeu: “Mais fácil não, mas diferente”. Senti o dedo da assessoria orientando-o, previamente, sobre a questão. Se respondesse que sim, como imagino que por si diria, seria uma forma de reconhecer que o time da Mercedes estava mesmo muito em baixa no fim do campeonato de 2012.
O discurso de Hamilton, sábado, foi outro. Afirmou que pode ganhar um GP este ano. Antes sequer admitia a possibilidade. É o resultado de ter completado o equivalente a 8,5 Gps em quilometragem nos testes e compreendido que o W04 pode lhe permitir um ano melhor do suposto antes de sentar no cockpit, tendo em conta o histórico da Mercedes desde a volta à Fórmula 1, em 2010.
Não sei como será em Melbourne e menos ainda na Malásia, com aquele calor todo. Mas na curva 9 de Barcelona vi o W04 superá-la com surpreendente desenvoltura. E ali exige-se boa geração de pressão aerodinâmica. Como escrevi antes, Hamilton e Rosberg perdem mais tempo no volta a volta seguido que Vettel, Grosjean e Alonso, por exemplo, mas em uma volta lançada impressiona.
Não creio que Hamilton e Rosberg estivessem com gasolina apenas para aquela volta rápida, na simulação de classificação. Pode até ser o caso, mas não os levaria a nada. Ao contrário, criaria a mesma expectativa do ano passado, quando da mesma forma realizaram bela pré-temporada e depois não corresponderam ao que esperava. Seria repetir um equívoco. E tudo o que a Mercedes não precisa, agora, é ter ainda mais pressão da já existente.
Hamilton deverá andar mais à frente do que imaginava, desde o começo da temporada. Quanto à frente precisamos esperar as desafiadoras 56 voltas no circuito de Sepang, na Malásia, sob temperatura sempre superior a 30 graus Celsius.
Nico Rosberg
Quilometragem percorrida na pré-temporada: 2.639,8 (2.º)
Melhor tempo em Barcelona: 1min20s130 (1.º), pneus macios, dia 03/03.
O ser humano produz por estímulo ou castigo. Pois pode acreditar que Rosberg está mais que estimulado. Compartilhar a Mercedes com Hamilton está exigindo elevado estado de vigília, dedicação, estudos e investimento em trabalho.
Um profissional da organização, há muito conhecido, disse-me vê-lo bem distinto: “Nico aprendeu muito com Michael (Schumacher) a prestar atenção em todos os detalhes. Tudo interfere no resultado final. Nos dizia entender por que Michael ganhou sete títulos. Mas agora o vejo se aprofundar mais ainda em todas as questões, deseja saber o que se passa, o que estamos fazendo”.
Infelizmente o ambiente da Fórmula 1 se tornou doente e pessoas com quem você fala há mais de 15 anos de repente são proibidas de, oficialmente, conversar com você, por conta dessa política insana de nada poder sair da organização sem antes um assessor de imprensa avaliar se pode se dito. Perderam a noção do quão doentes estão. Virou uma obsessão. Isso me obriga a conversar com esses profissionais e simplesmente não escrever seus nomes para não comprometê-los. É ridículo, amigos.
Uma ocasião a assessora da então Honda, hoje na Marussia, Trace Novak, me viu aguardando Rubens Barrichello e Gil de Ferran e veio até onde eu estava para dizer que eles não iriam falar comigo, sem sequer saber se eu estava lá com intenções profissionais. Não tenho histórico de ser rude, pois nesse dia perdi a paciência. É o caso, agora, com técnicos que me esclarecem dúvidas ou mesmo me contam coisas, por saberem com vou tratar o assunto com profissionalismo. Muitas vezes, infelizmente, guardo para o meu conhecimento, apenas.
Rosberg deve disputar talvez, pelo que pudemos compreender, sua melhor temporada na Fórmula 1. Há razões para acreditarmos nisso. Mas no confronto com Hamilton eu me surpreenderia muito se vencesse. Não acredito.
Se alguém veio até o fim nesse texto parabéns. É um herói. Vamos ficar por aqui senão não terei um único leitor. Antes de embarcar para Melbourne, segunda-feira, ou durante a longa viagem até lá, espero poder colocar no ar outro post bem, mas bem menor, com a análise das seis escuderias restantes.
Abraços, amigos!
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