quarta-feira, 3 de abril de 2013

AZEDOU DE VEZ*

* Por Ivan Capelli


roda a roda – de maneira perigosa até – a liderança, aparentemente sem influência da equipe. O problema é que não foi exatamente assim. Após a última rodada de pit stops, a Red Bull escolheu Webber, que estava à frente, como vencedor. Pediu que os pilotos administrassem as posições, baixassem as rotações do motor e terminassem a corrida sem sustos. Mas Vettel desobedeceu as ordens, partiu pra cima e engoliu Webber. Estava feito o estrago.

E aí vem a mais contraditória das situações: os espectadores e fãs, em geral, detestam jogo de equipe. Querem ver briga na pista, e ela houve. Mas ninguém gostou da atitude do tricampeão e houve uma espécie de compaixão por Webber, por mais que normalmente todo mundo queira mesmo que um piloto mande ordens de equipe às favas. Que vença o melhor, não é isso? Vettel não foi o melhor?

Não. Simplesmente porque ambos estavam em condições desiguais. Webber obedeceu ordens, reduziu a potência, diminuiu o ritmo. Vettel ligou o foda-se, passou e não deu ao companheiro a chance de brigar em igualdade. Foi traíra. E de traíra ninguém gosta.

Não foi a primeira vez que isso aconteceu na F1. Michael Schumacher fez o mesmo com Rubens Barrichello na última volta do GP de Mônaco de 2005 e foi a gota d’água para que o brasileiro antecipasse o rompimento de seu vínculo com a Ferrari. Em outro momento mais célebre, Didier Pironi colocou Gilles Villeneuve na mesma situação no GP de San Marino de 1982. E foi um evento até mais grave, já que o francês ultrapassou o canadense “ilegalmente”, mas tomou o troco. A equipe mandou tudo ficar como estava e Pironi desobedeceu de novo. E eles trocaram de posições mais duas vezes, enquanto Villeneuve acreditava piamente que ganharia a prova porque assim estava combinado. Quando Pironi cruzou a linha em primeiro, estava desfeita ali uma amizade, e para sempre. Gilles perderia a vida duas semanas depois num acidente quando tentava desnecessariamente superar o companheiro nos treinos em Zolder. O leite azedou de forma trágica.

Em Sepang, a própria equipe, pelo rádio, deu o recado para Vettel: “Isso foi infantil, Seb”. E desculpou-se com Webber: “Ele foi informado”. É admirável que o alemão tenha a sanha de vencer, que não queria ficar atrás de forma alguma, mas daí para escorregar no limite ético basta um passo. E Vettel cruzou essa linha hoje enquanto fazia uma bela ultrapassagem.

O resultado disso foi um pódio dos mais constrangedores da história da F1. Na antessala da premiação, Sebastian tomou uma reprimenda de Adrian Newey. Quando Webber chegou, nem olhou nos olhos do colega, passando reto. E esbravejou qualquer coisa, que só não virou bate-boca por causa das câmeras. No pódio, todos com cara de cu. Inclusive Lewis Hamilton, que só foi terceiro por ordem da equipe, que não deixou Nico Rosberg, visivelmente mais rápido, ultrapassar. Mas, neste caso, foi uma combinação devidamente cumprida. Lewis poderia estar constrangido, mas não houve desrespeito nem deslealdade.

Na coletiva, Webber foi bastante duro: “Seb tomou suas próprias decisões hoje e terá proteção, como de costume. E é assim que é”. O australiano entende que o companheiro tem respaldo da equipe, que precisará se esforçar para demonstrar que não é bem assim. Até porque agora dificilmente Mark obedecerá ordem semelhante quando estiver em desvantagem. O relacionamento complicado na equipe, antecipado pela Revista Warm Up há 10 dias, azedou de vez. Vettel admitiu a culpa, pediu desculpas, mas isso não se resolverá assim. Ayrton Senna e Alain Prost nunca mais conseguiram conviver depois que o brasileiro fez algo similar em Imola, em 1989. E confiança, uma vez quebrada, nunca mais se reconquista.

Vettel, até então um sujeito de reputação inatacável, precisa tomar cuidado. Está virando o fio.

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