sexta-feira, 25 de maio de 2012

A MÍSTICA DE MÔNACO EM ANOS COM FINAL 2*

* Por Leonardo Felix


Em uma temporada tão bizarra quanto 2012, tornou-se até maldade prever GPs movimentados e com resultados surpreendentes. Cada carro consome a borracha da Pirelli de maneira diferente em cada tipo de circuito, levantando as orelhas de engenheiros e colocando a criatividade de estrategistas à prova.

As corridas passaram a ser sortidas em possibilidades e quem acerta a mão no consumo de pneus e na estratégia acaba galardoado com o lugar mais alto do pódio. Até aqui, foram cinco vencedores diferentes, de cinco times distintos, a comemorarem vitórias em cinco etapas nesta temporada. Virá o sexto em Mônaco?

Julgando pelo que aconteceu em todas as corridas disputadas em Monte Carlo nos anos terminados com o algarismo 2, é de se apostar que sim, já que todas elas foram visitadas pela zebra e tiveram vencedores que fugiam aos nomes favoritos da época. O Tazio Autosport detalha caso a caso e mostra que, se a mística for mantida, a corrida do próximo domingo promete surpresas e emoção.


1962 - Hill e Clark ficam pelo caminho; McLaren agradece

A primeira etapa oficial da temporada 1962 já prenunciava o início do duelo entre duas novas caras da F1: Graham Hill e Jim Clark. Os dois dominaram o GP de abertura, na Holanda, e o inglês da BRM ficou com a vitória depois que o escocês da Lotus enfrentou problemas mecânicos.

Em princípio, a segunda rodada em Mônaco representaria o segundo assalto da disputa e os dois concorrentes logo se posicionaram nas duas posições no grid de largada (aliás, essa foi a primeira de um total de 33 poles na carreira de Clark).

Vale lembrar que o traçado de Monte Carlo era razoavelmente diferente naquela época. A reta principal ficava no trecho entre a curva da Tabacaria e a freada do que hoje é a Rascasse. Os esses da Piscina não existiam, formando uma só reta naquele ponto, e o complexo da Rascasse e da Anthony Noghès era só um hairpin.

As coisas começaram a embaralhar já na largada, quando o belga Willy Mairesse, da Ferrari, forçou uma ultrapassagem para cima dos dois favoritos na curva 1, levando Hill a espalhar e Clark a rodar. Trevor Taylor, que também defendia a Lotus, e Innes Ireland, da equipe particular UDT Laystall, foram outros dois envolvidos no enrosco.

Bruco McLaren, que largava em terceiro e nada tinha com o lance, assumiu a ponta, mas poucas voltas depois seria ultrapassado por Hill. Depois de cair para sexto, Clark escalou o pelotão e logo ressurgiu em segundo, aproximando-se do líder, em mais uma de suas costumeiras provas de recuperção. Entretanto, a alegria do escocês só durou até a volta 55, quando um problema de embreagem o forçou a abandonar.

Hill, que mais tarde seria chamado de "Mr. Monaco", por suas cinco vitórias no Principado, passou a desfilar na ponta, mas seu primeiro triunfo no tradicional circuito de rua não viria daquela vez. Na 93ª volta (de um total de 100, já que a pista era mais rápida e mais curta), o motor V8 da BRM abriu o bico e McLaren herdou aquela que seria a única vitória dele e da defasada Cooper na temporada. O neozelandês até tomou um calor do campeão Phil Hill no final, mas conseguiu receber a quadriculada dois segundos à frente do americano da Ferrari.


1972 - A mágica de Jean-Pierre Beltoise

Desde sua estreia na F1, o francês Jean-Pierre Beltoise nunca justificou as expectativas nele depositadas quando foi campeão da F2 Europeia com a Matra. A montadora de seu país investiu nele até 1971, mas se cansou da falta de resultados expressivos e o dispensou ao fim daquele ano.

Beltoise acabou se arranjando na BRM para a temporada seguinte e não vinha fazendo nada chamativo no time inglês até Mônaco, quarta etapa do calendário. Naquele fim de semana, Jean-Pierre já surpreendera a todos na quinta-feira, dia em que posicionou o deficitário modelo P160B no quarto lugar do grid provisoriamente. Como choveu no sábado, os tempos não foram melhorados na segunda sessão classificatória e o francês, confirmado na segunda fila, aproveitou para testar acertos de pista molhada, caso as condições perdurassem no domingo.

E elas perduraram. A prova aconteceu com pista encharcada e Beltoise assumiu a ponta logo na primeira volta, imprimindo um ritmo muito mais forte que o de qualquer outro competidor. Ele venceu com mais de 30 segundos de distância para o gênio da chuva à época, Jacky Ickx, e uma volta sobre o terceiro colocado, nada menos que o campeão daquele ano, Emerson Fittipaldi. Foi o grande momento de brilho de Beltoise na F1, já que o francês nunca mais venceria. Foi também a única corrida em 72 que ele terminou na zona de pontos.


1982 - Uma corrida do barulho

Fosse o GP de Mônaco de 1982 anunciado pelo locutor da Sessão da Tarde, ele diria que os líderes daquela prova "aprontaram altas confusões que até Zeus duvida" nas últimas voltas. O que aconteceu naquele 23 de maio viraria história de pescador se não tivesse ocorrido em uma época onde as corridas já eram registradas de forma mais decente pelas câmeras de televisão.

Resumindo a ópera: René Arnoux largou da pole com a Renault, equipe a ser batida em Monte Carlo (e acabou sendo, mas por seus próprios pilotos, como veremos a seguir). O francês liderava tranquilo até que, no 15º giro, rodou sozinho na saída do primeiro Esse da Piscina, deixando o motor morrer.

O companheiro Alain Prost, logo atrás, tomou a ponta e passou a comandar as ações. Só que o Prost de 82 não era aquele piloto cerebral e senhor de si que disputava títulos com Ayrton Senna entre o fim dos anos 80 e início dos 90. Era um mero e narigudo jovem, muito veloz e impetuoso, é verdade, mas que muitas vezes pagava pelo excesso de arrojo.

Pois é... O Prost de 82 era capaz de, a três voltas do fim, com um mundo de vantagem sobre o segundo colocado, errar sozinho na saída da Chicane do Porto e bater, vítima de uma garoa que umedecera levemente a pista.

O primeiro lugar foi para Riccardo Patrese, colega de Nelson Piquet na Brabham, mas o italiano sentiu a pressão de nunca ter vencido e também rodou no piso escorregadio, na penúltima volta, entre a Mirabeau e a Lowes.

Didier Pironi, com a forte Ferrari, assumiu a dianteira a partir de então e pilotou cuidadosamente pelos 3.312 metros do traçado monegasco, rumo à glória de seu segundo triunfo no ano.

O francês não fez nada errado, tão cuidadoso que foi, mas, no último giro, na entrada do túnel, um problema elétrico o tirou da corrida. Atrás dele vinha o mito Andrea de Cesaris, piloto da Alfa Romeo, que nem pôde saborear a liderança, visto que estava sofrendo uma pane seca no mesmo momento.

A situação era tão grotesca que nenhum narrador, incluindo Galvão Bueno, conseguia saber quem iria vencer. Na realidade, nem Patrese sabia, ao cruzar a linha de chegada pela última vez, que o sorteado acabou sendo ele, recuperado da rodada, naquela que seria sua primeira vitória da carreira.


1992 - Com trapalhada da Williams, brilha a estrela de Senna

Ninguém que não fosse Nigel Mansell poderia ser considerado favorito para qualquer corrida de 1992. Nem mesmo Ayrton Senna, do alto de seu tricampeonato e de sua obsessão por vitórias, era páreo para o bigodudo inglês e sua Williams FW14B com suspensão ativa, controle de tração e demais parafernalhas eletrônicas.

Em Mônaco, o script das cinco corridas anteriores se repetia à risca: Mansell dominou a classificação, disparou em primeiro desde a primeira volta e deixou para o resto as migalhas. No caso de Senna, a atuação naquele domingo valia um segundo lugar, à frente da outra Williams, de Riccardo Patrese, o que já era um bom feito.

Mas a conexão cósmica do brasileiro com aquela pista era uma coisa um tanto quanto metafísica e quis o destino que Mansell sofresse um furo em um dos pneus, tendo de rumar aos boxes para trocar a borracha avariada no fim da volta 70.

Quis o destino ainda que a Williams fosse uma equipe péssima em trabalho de pitstops, atrapalhando-se para substituir o composto traseiro direito e devolvendo o Leão à pista atrás de Ayrton.

Tendo um carro naturalmente superior e ainda calçado com pneus mais novos, Mansell veio babando para cima de Senna nas voltas finais. "Já é difícil passar em Mônaco, muito mais difícil é passar Ayrton Senna", tonitruou sabiamente Cleber Machado na transmissão brasileira.

Com uma pilotagem defensiva impecável, Senna não deu brecha para que Mansell fizesse a ultrapassagem. Nigel gingava de um lado para o outro e tentava achar um espaço que o brasileiro não dava. Vão esforço diante de um piloto determinado a agarrar aquela singela chance com todas as forças.

Após três das voltas mais famosas e longas do Principado, Senna relaxou para conquistar sua quinta vitória em Monte Carlo, igualando o recorde de Graham Hill.


2002 - Coulthard interrompe domínio de Schumacher

Tirando o GP da Malásia, Michael Schumacher estava sobrando em 2002, tendo vencido cinco das seis primeiras etapas (incluindo o desastroso GP da Áustria, é preciso frisar). Contudo, o alemão não conseguiu manter a hegemonia no treino classificatório em Mônaco, pecado mortal em um circuito tão travado e que lhe custou a vitória.

Com o desempenho de sábado, Schumacher alinhou em terceiro no grid de largada, atrás do pole Juan Pablo Montoya e de um disposto David Coulthard na segunda posição.

O escocês arrancou muito bem na largada, superou Montoya e determinou ali os rumos da corrida. Enquanto o colombiano freava o ímpeto de Schumacher na briga pelo segundo lugar, David abria vantagem substancial na ponta, uma atuação realmente dominante.

Montoya encerraria sua campanha prematuramente, quando o motor BMW lhe deixou na mão na volta 46. Livre do rival, Schumi chegou a se aproximar perigosamente de Coulthard, virando quase um segundo por volta mais rápido no fim da corrida. Mas aquele era o dia do escocês e David anotou o único triunfo da McLaren na temporada, o 12º e penúltimo de sua carreira.

Em contrapartida, aquela prova foi muito ruim para os brasileiros: na abertura da 28ª passagem, Felipe Massa abalroou Enrique Bernoldi na entrada da Sainte Dévote e ambos caíram para a parte de trás do pelotão. Massa ainda voltaria a bater sozinho no mesmo ponto, na volta 64, deixando a corrida de vez.

Rubens Barrichello também se envolveu em um acidente enquanto disputava o sexto lugar com Kimi Raikkonen, enchendo a traseira do carro do finlandês na freada da Chicane do Porto, avariando o bico e tendo de fazer um pit extra. Ele terminou a corrida em sétimo.

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